ÁRIDO DEMAIS
Com um material tão rico e explosivo em mãos, chega a ser imperdoável o resultado frio e alienante que Soderbergh atingiu.
- por André Lux, crítico-spam
A segunda parte do épico “Che” tem os mesmos defeitos da primeira. É por demais contemplativa, fria, chega a ser árida até. E com um agravante: foca-se totalmente na fracassada luta armada comandada por Guevara na Bolívia, culminando com seu assassinato covarde pelo exército boliviano sob ordens da CIA quando já era prisioneiro. Ou seja, é totalmente anticlimática.
Por mais que se admire a coragem do diretor Steven Soderbergh em aceitar tão controversa empreitada, não dá para entender algumas de suas opções estéticas.
A mais estranha delas foi filmar quase tudo em planos abertos e distantes, o que não dá maiores oportunidades aos atores e impede qualquer aprofundamento dos personagens - ao ponto de todos parecerem meros coadjuvantes, inclusive o próprio Che (mal dá para perceber a presença de Rodrigo Santoro, como Raul Castro, ou mesmo Matt Damon, que faz ponta como um padre). Além disso, o cineasta joga os eventos de forma caótica e confusa, o que vai deixar a maioria dos espectadores alienados e, por fim, entediados.
Parece que Soderbergh ficou tão preocupado em parecer neutro e fugir de qualquer tipo de panfletarismo (tanto de esquerda quanto de direita) que se esqueceu do principal: contar uma história. Embora ambos os filmes tenham uma perfeita reconstituição dos fatos (mostra, inclusive, o respeito que os guerrilheiros tinham pelos camponeses e a participação ativa do governo dos EUA no treinamento e combate à guerrilha), o distanciamento e a secura como tudo é apresentado impede que entremos na trama ou mesmo vivenciemos o drama dos personagens.
“Che” passa ao largo também de qualquer aprofundamento ideológico ou político, exceto por meia dúzia de frases soltas que, tiradas do contexto e sem qualquer peso, viram mera citação, quase clichês. Benício Del Toro, na maioria das cenas, parece um robô, sempre com a mesma expressão sorumbática. Nem mesmo a cena do assassinato brutal do Che passa qualquer emoção - e o que deveria ser a derradeira cena para o ator é absurdamente filmada por meio de uma câmera subjetiva!
Com um material tão rico e explosivo em mãos, chega a ser imperdoável o resultado frio e alienante que Soderbergh atingiu. Às vezes “Che” parece querer ser um épico do Akira Kurosawa, tipo “Ran” ou “Kagemusha”, mas sem aqueles momentos de total arrebatamento em que o mestre subvertia a estética acadêmica até então dominante e sacodia o espectador pelo pescoço.
Walter Salles em “Diários de Motocicleta” abordou a juventude de Guevara e o início de sua tomada de consciência, conseguindo um resultado muito mais humano e tocante sem ser panfletário e tendo um material bem menos forte para trabalhar.
Apesar de tudo, não deixa de ser curioso analisar a fracassada luta de Guevara na Bolívia com a realidade atual da América Latina, que se liberta do julgo imperialista estadunidense e da opressão de suas elites econônicas, depois da eleição de vários políticos de esquerda, como Lula, Evo Morales, Hugo Chaves e afins.
O que vem ao encontro do que Guevara responde a um de seus algozes quando este lhe pergunta o que havia conquistado na Bolívia, já que a população pobre não aderiu à guerrilha: “Não sei. Talvez nosso fracasso ajude a despertar os oprimidos”. Nada mais profético...
Cotação: * 1/2
5 comentários:
Parabéns por tão sinceras expressões. Concordo Ipsis literis.
"Não há hospitais para todos, não há escolas. A mortalidade infantil atinge índices catastróficos e, o povo com fome. Estão ou não criadas as condições para a revolução? Óbvio que sim!"
DEUS!
Perfeito.. Excelente resenha, concordo plenamente...
Abraços...
muito mais que mito,muito mais que lenda,un heroi de verdade,un homen que lutava pur un idealnao so pra si ;para o mundo.vivaaaaaaaaaaaaaaaa a che guevara.
Cara, a camera distanciada tem um sentido. No primeiro havia muitos closes, no segundo a imagens afastadas nos dizem o que realmente transparece... pense a respeito.
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