MENSALÃO MADE IN U.S.A.
Filme vai chocar puritanos, ingênuos e hipócritas ao descobrirem que a
libertação dos negros nos Estados Unidos se deu através da compra de votos, da mentira e da manipulação dos fatos
- por André Lux, crítico-spam
“Lincoln” de Steven Spielberg é uma verdadeira aula de como se faz política
no mundo real e é talvez o melhor filme do cineasta desde “A Lista de
Schindler”. O roteiro é excepcional e foca-se no início do segundo mandato do
presidente estadunidense, justamente quando, em meio a uma sangrenta guerra
civil, dedicou-se de corpo e alma para aprovar a emenda constitucional que
acabou com a escravidão nos EUA.
O filme vai com certeza chocar puritanos, ingênuos e hipócritas em geral ao
descobrirem que a libertação dos negros nos Estados Unidos se deu através da
compra de votos de parlamentares (isso mesmo: um “mensalão made in
U.S.A.”!), da mentira descarada e da manipulação dos fatos feitas por Lincoln e
seus assessores para que a guerra continuasse mesmo quando emissários do Sul
estavam a caminho de Washington para propor a paz. Ao que voltamos à velha
pergunta retórica que tira o sono de muita gente: afinal, os fins justificam os
meios? Valeu a pena abolir a escravidão nos EUA fazendo uso da pura e simples
corrupção, da mentira e da manipulação dos fatos? Bem, pergunte isso a alguém como,
digamos, Barack Obama, e você talvez tenha a resposta para sua questão...
Esse é o filme mais maduro de Spielberg, que está extremamente contido e
fazendo uso de movimentos de câmera discretos, porém precisos, empregando
inclusive o termo “negro” abertamente tal qual era usado naquela época e que
hoje é considerado ofensivo aos afro-americanos. Ou seja, não tem medo de ser
polêmico e de provocar debates, deixando de lado a sua tendência a ser didático e
infantilóide que detona a maioria de suas tentativas de fazer filmes para
adultos pensantes.
O filme conta com uma extraordinária atuação do grande Daniel Day-Lewis,
que não se deu bem em papéis de cunho histórico em filmes como “Gangues de Nova
York” e “Sangue Negro” onde perdeu-se em caracterizações descontroladas e
caricatas. Seu Abraham Lincoln é impressionante, muito por ser discreto e
elegante sem nunca apelar para tiques ou trejeitos manjados, fazendo com que
muitas vezes nos esqueçamos de estar diante de um ator e não da figura histórica
propriamente dita (ajuda muito também a maquiagem perfeita).
O elenco de coadjuvantes é memorável, a começar por Sally Field, excelente
como a primeira-dama que se encontra no limite da sanidade devido à morte do filho mais novo, e Tommy Lee Jones como um congressista que é radicalmente
a favor da libertação dos escravos e que precisa, em nome de um bem maior (o fim
da escravidão), mudar de posicionamento em uma seção do Congresso ao ser
confrontado pela oposição Democrata que deseja fazer uso de suas opiniões
radicais em favor da causa dos escravagistas. A belíssima música do mestre John
Williams dá o tom do filme, solene e majestosa, sem nunca ser intrusiva.
Vale destacar também que será uma surpresa para muita gente saber que foi o
partido Republicano quem liderou a campanha pelo fim da escravidão, enquanto os
Democratas lutavam pela manutenção do regime desumano. Isso mesmo, o partido de
George W. Bush e afins é que libertou os escravos de seus grilhões! O que será
que os dementes do Tea Party teriam a dizer sobre isso hoje, não? Realmente, uma
pergunta que não quer calar...
Cotação: * * * * *
2 comentários:
O filme é político e mostra o empenho do presidente em abolir a escravatura através da 13º emenda. Daniel Day-Lewis está ótimo no papel, embora acho que sua melhor atuação é no filme "Meu Pé Esquerdo".
Gente, dormi neste filme. Prefiro a realidade dos fatos.
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