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domingo, 10 de janeiro de 2021

“Manhunt: Unabomber” mostra como ressentimento e ódio aliados ao extremismo político podem ser perigosos


- por André Lux

A mini-série “Manhunt: Unabomber” conta a história real do desfecho dos 17 anos de caçada ao terrorista que mandava bombas pelo correio e causou a morte de três pessoas, deixando outras dezenas de feridos.

São oitos episódios que alternam três linhas temporais. Em uma delas acompanhamos os esforços do agente do FBI James Fitzgerald, interpretado por Sam Worthington (de “Avatar”) cuja apatia atua em favor do personagem. Ele é recrutado pela força-tarefa do FBI para tentar encontrar pistas a partir das cartas enviadas pelo terrorista. Porém, logo descobre que ninguém leva a sério suas análises, já que essa técnica ainda era uma novidade e os agentes da velha guarda obviamente resistiam a ela.

Aos poucos ele vai conseguindo identificar padrões linguísticos nos textos do Unabomber e traça um novo perfil dele, bastante diferente do que existia até então. Hoje sabemos que se tratava de Ted Kaczynski, um matemático superdotado com QI muito acima da média que usava os ataques com bomba para se vingar da sociedade que o rejeitava (ele nunca teve um relacionamento afetivo e é virgem até hoje, o que explica em grande parte seu ressentimento).

Na segunda linha temporal, vemos as conversas que Fitzgerald trava com Kaczynski já na prisão na tentativa de induzi-lo a confessar seus crimes e admitir a culpa, algo que era desejável pelo governo do EUA. Esses encontros entre eles não ocorreram na vida real e foram criados apenas para dar algum peso dramático ao desfecho do julgamento do terrorista, embora ele tenha de fato se declarado culpado e cumpre até hoje várias sentenças de prisão perpétua.

A terceira linha narrativa apresentada pela série aborda o passado de Kaczynski, sua infância desajustada e solitária, sua adolescência tendo que estudar numa universidade com apenas 16 anos e, principalmente, os fatos chocantes que mostram ter sido usado como cobaia em experimentos do governo que queriam promover lavagem cerebral em agentes soviéticos capturados nos EUA. Ali ele sofreu todos os tipos de abusos, violências e humilhações físicas e psicológicas, o que certamente acionou os gatilhos que o transformaram em um sociopata perigoso.

As cenas que mostram esses experimentos parecem irreais, porém quando descobrimos que realmente aconteceram fica impossível não sentir empatia pelo personagem. Esse é o maior trunfo da série, principalmente quando traça paralelos entra as teorias do Unabomber e o comportamento obsessivo do agente do FBI que chega a se alienar totalmente da família em sua busca pelo terrorista. Nesses momentos, “Manhunt: Unabomber” mostra de forma cristalina como é fina a linha que separa a sanidade da loucura e a crítica contra os abusos do sistema da paranoia delirante.

Muitos dos questionamentos feitos por Kaczynski reverberam até hoje, principalmente no que diz respeito à escalada da tecnologia que destrói nossa humanidade, porém é evidente que seus ataques à sociedade são motivados somente por ódio, inveja e ressentimento por não ser capaz de se ajustar a ela e não por uma profunda consciência social e política. Ou seja, muito parecido com o que vemos atualmente em extremistas de direita que apoiam de maneira irracional políticos que dão voz e legitimidade a esse ressentimento, cujas consequências nefastas assistimos escalando a cada dia no mundo todo, inclusive no Brasil. 

A série é muito bem dirigida por Greg Yaitanes (de “Os Filhos de Duna” e vários episódios de “House”) e conta com uma interpretação brilhante de Paul Bettany (o “Visão” de “Os Vingadores”) como Kaczynski. Para quem gosta do gênero, é imperdível.

Cotação: ****

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