MASTURBAÇÃO MENTAL PORRETA
Diretor apaixonado pelo próprio umbigo tenta impressionar platéia com enigma indecifrável, cuja chave guardou só para ele e seus amigos mais chegados. Pseudo-intelectuais ficarão em êxtase.
- por André Lux
De tempos em tempos surge um filme sem pé nem cabeça feito por um sujeito pretensioso e auto-indulgente que deixa em êxtase os pseudo-intelectuais-metidos-a-besta de plantão. Como sabemos, existem pessoas que, ao não conseguir decifrar o significado de uma obra sem sentido que finge ser hiper-profunda, passam a endeusar seu realizador. David Lynch, por exemplo, adora enganar essa turma - tanto que chegaram a lhe dar prêmios por filmes ridículos como “Cidade dos Sonhos” (que não passava de um piloto rejeitado para série de TV no qual o diretor enfiou um monte de imagens delirantes que nada tinham a ver com a trama e um final enigmático para poder vender como longa-metragem).
O diretor Darren Aronofsky é outro desses charlatões. Mas, ao contrário de Lynch, Aronofsky se leva a sério e acha mesmo que tem algo seminal a dizer em cada filme que lança. Foi assim com o indecifrável “Pi” (sim, o título é aquele símbolo matemático, vejam só que chique!) e com o grotesco “Réquiem para Um Sonho” (que abordava de forma moralista o mundo das drogas e tinha como ponto alto uma dona de casa delirante sendo atacada por sua geladeira). Seu novo filme, “A Fonte da Vida” é mais um exemplo da obsessão do rapaz em impressionar seus admiradores os quais, novamente privados propositalmente de entender o significado de sua obra, vão achá-lo o máximo.
Se não acredita em mim, confira a trama do filme: alternando três realidades paralelas, “A Fonte da Vida” quer lançar luz sobre temas como “o sentido da vida”, “a força do amor” e a “imortalidade da alma”. Para isso, mistura imagens da inquisição espanhola, de uma busca pela cura do câncer e de um sujeito careca que viaja dentro de uma bolha de sabão intergaláctica à procura da vida eterna! Tudo isso embalado por cenografia e direção de fotografia soturnas, diálogos sussurrados pomposamente e uma trilha musical repetitiva e sufocante (mas gravada pelo conjunto Kronos Quartet, que luxo!).
Mas, pense de novo, pois nem tudo é o que parece. Aos poucos, somos ensinados que, na verdade, é a trama do presente que vale. Nela, vemos um casal formado por Hugh Jackman (o Wolverine de “X-Men”) e Rachel Weisz (de “A Múmia” e o “Jardineiro Fiel”.). Ela está morrendo de câncer e ele parece ser um cientista-cirurgião que procura desesperadamente a cura para a doença, na esperança de salvar a esposa. Entre as seções de quimioterapia e repentes de "iluminação espiritual", a moça escreve um romance passado na Espanha na época da Inquisição (detalhe: o livro é todo escrito à mão, com caneta tinteiro, letra perfeita e sem nenhum traço de Errorex!). A rainha Isabel (interpretada pela própria Weisz) passa uma missão ao seu mais fiel conquistador (o mesmo Jackman): achar a árvore da vida eterna (ou será a fonte da juventude?), localizada num templo Inca perdido na América central, pois só isso pode salvar seu reino da iminente invasão de um fanático religioso (sem dúvida um plano genial!).
Corte rápido para o mesmo Jackman, agora carequinha e de pijama, viajando pelo espaço sideral dentro de sua nave-bolha em busca de uma estrela moribunda, chamada pelos Incas de “Xibalba”, que em breve vai virar super-nova e, assim, devolverá a vida à sua ex-mulher. Enquanto não chega lá, ele flutua pelo ar, faz exercícios de tai-chi-chuan, come pedacinhos da árvore da vida (que está com ele na bolha) e tem alucinações com o passado. Ou será com o futuro? Vai ver tudo isso é só uma representação simbólica da jornada interior do personagem principal, que se recusa a aceitar a morte do ente amado. Pode ser também uma história-dentro-da-história que está sendo contada. Ou mesmo uma alucinação cognitiva do protagonista, que se proteja num futuro (ou passado?) longínquo para tolerar o presente. Como se vê, é masturbação mental das mais porretas!
Para muitos, toda essa baboseira pseudo-profunda sem sentido vai parecer algo magistral. Mas, para quem procura filmes realmente inteligentes (como “2001”, “Solaris” ou mesmo a trilogia “Matrix”), cujas alegorias enigmáticas se resolviam e se relacionavam intrinsecamente dentro do próprio roteiro, “A Fonte da Vida” é só mais uma obra aborrecida, pretensiosa e indecifrável - até porque o diretor guardou a chave do enigma que apresenta só para ele e, talvez, seus amigos mais íntimos. E, convenhamos, não é possível deixar de ridicularizar um filme que mostra personagens pronunciando, com total seriedade e afetação, a palavra “Xibalba” a cada 10 minutos de projeção!
Se você gosta de ser enganado por artistas apaixonados pelo próprio umbigo para se sentir inteligente, vá em frente. Esse filme é pra você. Caso contrário poupe seus preciosos neurônios para tentar decifrar obras ricas e que realmente têm algo a dizer sobre a condição humana.
Cotação: *
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quinta-feira, 30 de novembro de 2006
sexta-feira, 17 de novembro de 2006
Filmes: "OS INFILTRADOS"
OS RATOS TAMBÉM AMAM
Diretor Martin Scorsese finalmente consegue agradar tanto aqueles que buscam um produto de maior refinamento artístico, quanto os que preferem apenas passar algumas horas se entretendo no cinema.
- por André Lux
Sei que o que vou declarar a seguir soará como uma heresia a muitos profissionais da opinião que costumam idolatrar certos artistas, mas “Os Infiltrados” é o primeiro filme do diretor Martin Scorsese que eu realmente gostei, sem restrições. Tudo bem, reconheço que o sujeito é um bom diretor (especialmente de atores), que sabe tudo de cinema e inventa planos seqüências espetaculares. Mas só isso não basta para fazer um filme funcionar. Muitos de seus projetos anteriores, como “Gangues de Nova York”, “O Aviador” e “Os Bons Companheiros”, padeciam de narrações truncadas e excesso de duração, enquanto outros eram simplesmente chatos (“Época de Inocência” vem à mente, um filme onde absolutamente nada de interessante ocorre durante as mais de três horas de projeção!).
Nada disso acontece em “Os Infiltrados”. O filme é longo, mas a gente nem percebe, tamanho o nível de tensão e suspense que o diretor imprime em cada fotograma. Ficamos literalmente na ponta da cadeira durante quase toda a projeção, na expectativa do que vai acontecer em seguida na história. E o roteiro, inspirado no filme chinês “Internal Affairs”, reserva algumas surpresas chocantes, especialmente na conclusão.
Leonardo Di Caprio, que finalmente começa a ficar com cara de homem, está excelente no papel do policial que finge ser criminoso para se infiltrar na máfia irlandesa comandada por um verdadeiro psicopata (interpretado com seriedade e força por Jack Nicholson, que dá um show à parte). O ex-galã de “Titanic” consegue nos fazer sentir sua condição limítrofe por meio de vários nuances de interpretação, provando definitivamente que é um ator de verdade. No outro lado da moeda temos Matt Damon, que também funciona bem como o arrogante e inescrupuloso pau mandado do crime organizado infiltrado na polícia.
Apesar da direção de fotografia ser do consagrado Michael Bauhaus, Scorsese optou dessa vez por uma decupagem seca, isenta de malabarismos estéticos e mais focada nos atores, fator que deixa o filme ainda mais angustiante e realista, especialmente nas cenas de violência. Soma-se a isso uma montagem vibrante e uma trilha sonora que contrapõe canções pop intensas à partitura intimista de Howard Shore (o mesmo da trilogia “O Senhor dos Anéis”) e o resultado é um ótimo filme, capaz de agradar tanto aqueles que buscam um produto de maior refinamento artístico, quanto os que preferem apenas passar algumas horas se entretendo no cinema.
Em comum com outros filmes do cineasta, “Os Infiltrados” aborda o caos e a degradação urbana pelo ponto de vista da criminalidade sem ter uma moral definida, o que é algo sempre louvável particularmente nesses tempos moralistas em que vivemos atualmente. No mundo de Scorsese, ninguém presta, todos são mentirosos, manipuladores e falíveis. Não é à toa, portanto, que a figura que permeia o filme todo é a de um rato - tanto na forma de expressão verbal (que serve para rotular os infiltrados), quanto literal (na cena que encerra a projeção). Mas, atenção, até os ratos amam e são amados. Assim também como na vida real. Veja e comprove.
Cotação: * * * * *
Diretor Martin Scorsese finalmente consegue agradar tanto aqueles que buscam um produto de maior refinamento artístico, quanto os que preferem apenas passar algumas horas se entretendo no cinema.
- por André Lux
Sei que o que vou declarar a seguir soará como uma heresia a muitos profissionais da opinião que costumam idolatrar certos artistas, mas “Os Infiltrados” é o primeiro filme do diretor Martin Scorsese que eu realmente gostei, sem restrições. Tudo bem, reconheço que o sujeito é um bom diretor (especialmente de atores), que sabe tudo de cinema e inventa planos seqüências espetaculares. Mas só isso não basta para fazer um filme funcionar. Muitos de seus projetos anteriores, como “Gangues de Nova York”, “O Aviador” e “Os Bons Companheiros”, padeciam de narrações truncadas e excesso de duração, enquanto outros eram simplesmente chatos (“Época de Inocência” vem à mente, um filme onde absolutamente nada de interessante ocorre durante as mais de três horas de projeção!).
Nada disso acontece em “Os Infiltrados”. O filme é longo, mas a gente nem percebe, tamanho o nível de tensão e suspense que o diretor imprime em cada fotograma. Ficamos literalmente na ponta da cadeira durante quase toda a projeção, na expectativa do que vai acontecer em seguida na história. E o roteiro, inspirado no filme chinês “Internal Affairs”, reserva algumas surpresas chocantes, especialmente na conclusão.
Leonardo Di Caprio, que finalmente começa a ficar com cara de homem, está excelente no papel do policial que finge ser criminoso para se infiltrar na máfia irlandesa comandada por um verdadeiro psicopata (interpretado com seriedade e força por Jack Nicholson, que dá um show à parte). O ex-galã de “Titanic” consegue nos fazer sentir sua condição limítrofe por meio de vários nuances de interpretação, provando definitivamente que é um ator de verdade. No outro lado da moeda temos Matt Damon, que também funciona bem como o arrogante e inescrupuloso pau mandado do crime organizado infiltrado na polícia.
Apesar da direção de fotografia ser do consagrado Michael Bauhaus, Scorsese optou dessa vez por uma decupagem seca, isenta de malabarismos estéticos e mais focada nos atores, fator que deixa o filme ainda mais angustiante e realista, especialmente nas cenas de violência. Soma-se a isso uma montagem vibrante e uma trilha sonora que contrapõe canções pop intensas à partitura intimista de Howard Shore (o mesmo da trilogia “O Senhor dos Anéis”) e o resultado é um ótimo filme, capaz de agradar tanto aqueles que buscam um produto de maior refinamento artístico, quanto os que preferem apenas passar algumas horas se entretendo no cinema.
Em comum com outros filmes do cineasta, “Os Infiltrados” aborda o caos e a degradação urbana pelo ponto de vista da criminalidade sem ter uma moral definida, o que é algo sempre louvável particularmente nesses tempos moralistas em que vivemos atualmente. No mundo de Scorsese, ninguém presta, todos são mentirosos, manipuladores e falíveis. Não é à toa, portanto, que a figura que permeia o filme todo é a de um rato - tanto na forma de expressão verbal (que serve para rotular os infiltrados), quanto literal (na cena que encerra a projeção). Mas, atenção, até os ratos amam e são amados. Assim também como na vida real. Veja e comprove.
Cotação: * * * * *
quinta-feira, 16 de novembro de 2006
DVD: "ENRON – OS MAIS ESPERTOS DA SALA"
APAGÃO "MADE IN USA"
Filme denuncia a lógica capitalista que, cedo ou tarde, vai provocar danos irreversíveis ao planeta e colocar de joelhos a raça humana.
- por André Lux
Quando alguém vier pregar a você as maravilhas oriundas do enxugamento do Estado e das privatizações, pergunte se ele já assistiu ao excelente documentário “Enron – Os Mais Espertos da Sala”. Se a resposta for “não”, então nem perca seu tempo discutindo. Não vale a pena.
Quem acredita nessa ladainha que demoniza a regulamentação e o controle do Estado e pinta as empresas privadas como a salvação da economia só pode ser ingênuo ou mal intencionado.
O mais emblemático (e estarrecedor) exemplo das conseqüências destruidoras dessa corrente de pensamento inaugurada pelo ex-presidente Ronald Reagan na década de 1980, chamada carinhosamente de “neoliberal”, está registrada neste filme assinado por Alex Gigbey.
Exportada para o resto do mundo e implantada com maior voracidade nos países ditos de terceiro-mundo (Brasil, inclusive), essa ideologia que traveste o que existe de mais selvagem no capitalismo como sendo algo moderno, natural e irreversível, moldou e travou a mentalidade das pessoas na busca pelo consumismo sem limites (“consumo, logo existo”) e jogou a humanidade para a beira do abismo.
O caso da Enron ilustra de forma cabal o que acontece quando o cinismo, a arrogância, a ganância e a manipulação da informação se juntam sem qualquer limite e controle externo.
Apostando no que existe de mais agressivo em termos de marketing e relações públicas, seus executivos conseguiram elevar os preços das ações da empresa a níveis estratosféricos, sem que houvesse lastro real na contabilidade.
Isso se deu pela aplicação de uma técnica contábil absurda chamada de mark-to-market, por meio da qual projetavam lucros exorbitantes a partir do fechamento de transações que nem ainda haviam sido completadas, entre outras práticas simplesmente ilegais.
E, mesmo cientes da fragilidade e irracionalidade dos seus negócios, os manda-chuvas da Enron continuavam a propagar a solidez da empresa aos quatro ventos e estimulavam a compra das suas ações inclusive entre seus pobres funcionários que investiram nelas seus preciosos fundos de pensão.
Um das coisas que mais chama a atenção nessa história absurda é a maneira como a mídia e os analistas financeiros aceitavam e festejavam o “sucesso” da empresa sem levantar uma questão sequer a respeito desse verdadeiro milagre econômico – nem o fato da Enron atuar em uma dos mercados mais complexos e arriscados do mundo, que é o da prospecção e consumo de energia elétrica e gás, levantou suspeitas entre os “formadores de opinião” estadunidenses! Como se vê, o pensamento único propagado como verdade absoluta e incontestável não é privilégio da imprensa corporativa brasileira...
Todavia, o fato mais chocante deu-se quando negociadores (traders) da Enron literalmente derrubaram as usinas de força da Califórnia para fazer subir o preço da energia elétrica e salvar as finanças da empresa, prejudicando a economia do Estado e arriscando a vida de milhares de pessoas.
Essa operação está toda documentada e é apresentada didaticamente no filme, inclusive com gravações em áudio das conversar entre os negociadores, que não apenas falavam abertamente do golpe em andamento, como debochavam do povo que estava sofrendo as conseqüências.
Está aí representado o ápice do que o pensamento neoliberal, que visa o lucro financeiro acima de tudo e de todos, significa. Uma das conseqüências mais nefastas desse “apagão” operado pela empresa foi a queda do então governador da Califórnia, que acabou sendo substituído via um recall eleitoral no meio do mandado pelo ator Arnold Schwarzenegger (não por acaso do mesmo partido dos Bush). Qualquer semelhança com o “apagão” ocorrido no (desculpem o trocadilho) apagar das luzes do governo Fernando Henrique Cardoso não pode, portanto, ser mera coincidência.
E todas essas barbaridades aconteceram graças às brechas encontradas nas novas leis anti-protecionistas e ao suporte do governo Bush, recém eleito na época, cuja família mantinha laços estreitos com o fundador da Enron, Ken Lay, que chegou a ser cogitado para assumir uma pasta no secretariado do governo federal antes de ser condenado em seis acusações de fraude corporativa e morrer de ataque cardíaco em 2006 enquanto esperava a sentença.
No final, as ilusões criadas pelo criativo CEO da Enron, Jeffrey Skilling (condenado em 19 acusações de fraude corporativa), acabou e a empresa faliu totalmente em questão de semanas, deixando na miséria todos seus funcionários, mas não seus altos executivos que antes da derrocada já haviam vendido todas suas ações obtendo lucros astronômicos.
Essa história sórdida sobre os bastidores do capitalismo selvagem teria ficado oculta não fosse o trabalho dos jornalistas Bethany McLean e Peter Elkind, que dedicaram anos na investigação do caso Enron até a publicação do livro que dá nome ao filme.
Graças a isso, os principais ex-executivos da Enron foram presos e processados pela Justiça dos EUA. Prova de que o bom e velho jornalismo investigativo, praticamente extinto no Brasil, pode trazer contundentes resultados.
“Enron – Os Mais Espertos da Sala” é um filme obrigatório para qualquer pessoa interessada em conhecer os reais mecanismos que movimentam a lógica capitalista que, cedo ou tarde, vai provocar danos irreversíveis ao planeta e colocar de joelhos toda a raça humana - inclusive aqueles sujeitos que se julgam os mais espertos da sala.
Cotação: * * * * *
Filme denuncia a lógica capitalista que, cedo ou tarde, vai provocar danos irreversíveis ao planeta e colocar de joelhos a raça humana.
- por André Lux
Quando alguém vier pregar a você as maravilhas oriundas do enxugamento do Estado e das privatizações, pergunte se ele já assistiu ao excelente documentário “Enron – Os Mais Espertos da Sala”. Se a resposta for “não”, então nem perca seu tempo discutindo. Não vale a pena.
Quem acredita nessa ladainha que demoniza a regulamentação e o controle do Estado e pinta as empresas privadas como a salvação da economia só pode ser ingênuo ou mal intencionado.
O mais emblemático (e estarrecedor) exemplo das conseqüências destruidoras dessa corrente de pensamento inaugurada pelo ex-presidente Ronald Reagan na década de 1980, chamada carinhosamente de “neoliberal”, está registrada neste filme assinado por Alex Gigbey.
Exportada para o resto do mundo e implantada com maior voracidade nos países ditos de terceiro-mundo (Brasil, inclusive), essa ideologia que traveste o que existe de mais selvagem no capitalismo como sendo algo moderno, natural e irreversível, moldou e travou a mentalidade das pessoas na busca pelo consumismo sem limites (“consumo, logo existo”) e jogou a humanidade para a beira do abismo.
O caso da Enron ilustra de forma cabal o que acontece quando o cinismo, a arrogância, a ganância e a manipulação da informação se juntam sem qualquer limite e controle externo.
Apostando no que existe de mais agressivo em termos de marketing e relações públicas, seus executivos conseguiram elevar os preços das ações da empresa a níveis estratosféricos, sem que houvesse lastro real na contabilidade.
Isso se deu pela aplicação de uma técnica contábil absurda chamada de mark-to-market, por meio da qual projetavam lucros exorbitantes a partir do fechamento de transações que nem ainda haviam sido completadas, entre outras práticas simplesmente ilegais.
E, mesmo cientes da fragilidade e irracionalidade dos seus negócios, os manda-chuvas da Enron continuavam a propagar a solidez da empresa aos quatro ventos e estimulavam a compra das suas ações inclusive entre seus pobres funcionários que investiram nelas seus preciosos fundos de pensão.
Um das coisas que mais chama a atenção nessa história absurda é a maneira como a mídia e os analistas financeiros aceitavam e festejavam o “sucesso” da empresa sem levantar uma questão sequer a respeito desse verdadeiro milagre econômico – nem o fato da Enron atuar em uma dos mercados mais complexos e arriscados do mundo, que é o da prospecção e consumo de energia elétrica e gás, levantou suspeitas entre os “formadores de opinião” estadunidenses! Como se vê, o pensamento único propagado como verdade absoluta e incontestável não é privilégio da imprensa corporativa brasileira...
Todavia, o fato mais chocante deu-se quando negociadores (traders) da Enron literalmente derrubaram as usinas de força da Califórnia para fazer subir o preço da energia elétrica e salvar as finanças da empresa, prejudicando a economia do Estado e arriscando a vida de milhares de pessoas.
Essa operação está toda documentada e é apresentada didaticamente no filme, inclusive com gravações em áudio das conversar entre os negociadores, que não apenas falavam abertamente do golpe em andamento, como debochavam do povo que estava sofrendo as conseqüências.
Está aí representado o ápice do que o pensamento neoliberal, que visa o lucro financeiro acima de tudo e de todos, significa. Uma das conseqüências mais nefastas desse “apagão” operado pela empresa foi a queda do então governador da Califórnia, que acabou sendo substituído via um recall eleitoral no meio do mandado pelo ator Arnold Schwarzenegger (não por acaso do mesmo partido dos Bush). Qualquer semelhança com o “apagão” ocorrido no (desculpem o trocadilho) apagar das luzes do governo Fernando Henrique Cardoso não pode, portanto, ser mera coincidência.
E todas essas barbaridades aconteceram graças às brechas encontradas nas novas leis anti-protecionistas e ao suporte do governo Bush, recém eleito na época, cuja família mantinha laços estreitos com o fundador da Enron, Ken Lay, que chegou a ser cogitado para assumir uma pasta no secretariado do governo federal antes de ser condenado em seis acusações de fraude corporativa e morrer de ataque cardíaco em 2006 enquanto esperava a sentença.
No final, as ilusões criadas pelo criativo CEO da Enron, Jeffrey Skilling (condenado em 19 acusações de fraude corporativa), acabou e a empresa faliu totalmente em questão de semanas, deixando na miséria todos seus funcionários, mas não seus altos executivos que antes da derrocada já haviam vendido todas suas ações obtendo lucros astronômicos.
Essa história sórdida sobre os bastidores do capitalismo selvagem teria ficado oculta não fosse o trabalho dos jornalistas Bethany McLean e Peter Elkind, que dedicaram anos na investigação do caso Enron até a publicação do livro que dá nome ao filme.
Graças a isso, os principais ex-executivos da Enron foram presos e processados pela Justiça dos EUA. Prova de que o bom e velho jornalismo investigativo, praticamente extinto no Brasil, pode trazer contundentes resultados.
“Enron – Os Mais Espertos da Sala” é um filme obrigatório para qualquer pessoa interessada em conhecer os reais mecanismos que movimentam a lógica capitalista que, cedo ou tarde, vai provocar danos irreversíveis ao planeta e colocar de joelhos toda a raça humana - inclusive aqueles sujeitos que se julgam os mais espertos da sala.
Cotação: * * * * *
terça-feira, 14 de novembro de 2006
Tributo: Veja Basil Poledouris regendo temas de "Conan, o Bárbaro"
Abaixo, alguns links de videos no Youtube gravados durante concertos de "Conan, o Bárbaro" em Ubeda, na Espanha. Foi a última apresentação ao vivo do compositor Basil Poledouris, que morreu de câncer dia 08 de novembro.
1) Abertura do concerto e ANVIL OF CROM (Tema principal de "Conan, o Bárbaro).
2) Riddle of Steal (O Enigma do Aço).
3) Ovação e Bis de ANVIL OF CROM.
4) Um video-tributo ao compositor, apresentando antes do concerto em Úbeda.
5) Poledouris ensaiando a orquestra em Úbeda.
quinta-feira, 9 de novembro de 2006
Tristeza: Morre o compositor Basil Poledouris
Morreu ontem, dia 08 de novembro, aos 61 anos depois de perder a luta contra o câncer o compositor de músicas para o cinema Basil Poledouris.
Em seu currículo, estão partituras memoráveis para filmes como "Conan, o Bábaro", "Adeus ao Rei", "Robocop", "Caçada ao Outubro Vermelho", "Wind - A Força dos Ventos", "Quigley - Contratado para Matar", "A Lagoa Azul", entre muitas outras.
Era um dos meus compositores favoritos, embora tenha feito poucos trabalhos ultimamente. Mas sua música vai ficar para sempre, ao lado das de outros que também já se foram (como Jerry Goldsmith, Henry Mancini, Elmer Bernstein, etc) . Hoje novamente derramei lágrimas para uma pessoa que nunca conheci pessoalmente, mas cuja música tocou fundo, me ajudou em momentos difíceis e trouxe alegria e emoção à minha vida...
Reproduzo abaixo a despedida final escrita por Douglas Fake, da Intrada Records, selo especializado em trihas de cinema:
"Intrada shares with you in mourning the passing of one of the greats of movie music: Basil Poledouris. His gifts touched just about every producer, film maker, musician, soundtrack company, aficionado, and casual fan in the film industry.
His music inspired us to start our label. His customary generosity made that first album happen. What musical treasures he left for us all to enjoy!
Basil loved the outdoors, the water, the rush of salty air as he went boating. My last contact with him was over those very waters he so treasured.
I'll not see, nor feel, nor hear the likes of him again.
Ever."
segunda-feira, 6 de novembro de 2006
Filmes: O GRANDE TRUQUE
SEM MAGIA
Enredo até poderia render um bom entretenimento, mas diretor filma com mão pesada esquecendo de injetar humor e magia, fatores que seriam essenciais para ajudar a tornar tudo verossímil e desfrutável.
- por André Lux
Chirstopher Nolan é mais um diretor que parece estar sendo amaldiçoado com a síndrome do sucesso, “doença” que em muitos casos acaba transformada em excesso de pretensão. Depois do inventivo “Amnésia” (filme narrado literalmente de trás para frente que causou frisson entre os profissionais da opinião), nunca mais conseguiu emplacar um bom projeto, tropeçando no claudicante “Insônia” e no irregular “Batman Begins”. Seu novo filme, “O Grande Truque” é mais uma bola fora.
Pretensioso, arrastado e sem brilho, conta a história de dois mágicos que passam da amizade ao ódio num piscar de olhos e buscam superar um ao outro a qualquer preço, chegando ao limite da obsessão e da falta de ética. O enredo até poderia render um bom entretenimento, afinal traz escondido na manga várias surpresas e reviravoltas (algumas óbvias, outras nem tanto), mas Nolan dirige com mão pesada esquecendo de injetar humor (nem que fosse negro) e magia, fatores que seriam essenciais para ajudar a tornar tudo verossímil e desfrutável.
Um filme sobre dois sujeitos que ganham a vida fazendo truques e enganando suas platéias já tem um apelo limitado para começo de conversa. E tudo piora quando percebemos que ambos são extremamente desagradáveis, sujos e misóginos. Hugh Jackman (o Wolverine de “X-Men”) e Cristian Bale (o novo Batman) até tentam dar credibilidade aos seus personagens, mas são derrubados pela pretensão e pela mão pesada do diretor e acabam atuando de maneira composta e forçada (Bale é o mais prejudicado, se perdendo num sotaque esdrúxulo, enquanto Jackman parece “engomado”). O resto do elenco faz mera figuração e desperdiça figuras de peso como Michael Kane e a atual queridinha da crítica, Scarlett Johanson, num papel que não é nada.
“O Grande Truque” tem méritos (como a reconstituição de época e a fotografia) e até consegue manter certo interesse enquanto não revela todos os seus segredos e se concentra na busca pela superação dos mágicos, mas qualquer tentativa de seriedade e credibilidade é sumariamente destruída quando entra em cena uma máquina construída pelo doutor Tesla (o cantor David Bowie, numa composição risível), cujos efeitos são de fazer inveja ao DeLorean que viaja no tempo inventado pelo cientista maluco de “De Volta para o Futuro”. A gente até quer acreditar naquilo tudo, mas como o diretor esqueceu de nos “avisar” que se tratava de um filme de fantasia, o ridículo toma conta e só resta rir do que é mostrado com seriedade e profundidade descabidas.
Adicione a tudo isso uma conclusão nada satisfatória e uma música sem brilho (que apesar de composta por David Julyan traz o nome do canhestro Hans Zimmer na produção, o que sempre é mau sinal) e temos aí mais um filme errado e fora de foco (ao ponto de tentarem esconder que se trata de um filme de época nos cartazes publicitários!). Mais um daqueles tantos que são rapidamente esquecidos e jogados no limbo eterno dos “projetos-interessantes-derrubados-pela-pretensão-do-seu-realizador”...
Cotação: * *
Enredo até poderia render um bom entretenimento, mas diretor filma com mão pesada esquecendo de injetar humor e magia, fatores que seriam essenciais para ajudar a tornar tudo verossímil e desfrutável.
- por André Lux
Chirstopher Nolan é mais um diretor que parece estar sendo amaldiçoado com a síndrome do sucesso, “doença” que em muitos casos acaba transformada em excesso de pretensão. Depois do inventivo “Amnésia” (filme narrado literalmente de trás para frente que causou frisson entre os profissionais da opinião), nunca mais conseguiu emplacar um bom projeto, tropeçando no claudicante “Insônia” e no irregular “Batman Begins”. Seu novo filme, “O Grande Truque” é mais uma bola fora.
Pretensioso, arrastado e sem brilho, conta a história de dois mágicos que passam da amizade ao ódio num piscar de olhos e buscam superar um ao outro a qualquer preço, chegando ao limite da obsessão e da falta de ética. O enredo até poderia render um bom entretenimento, afinal traz escondido na manga várias surpresas e reviravoltas (algumas óbvias, outras nem tanto), mas Nolan dirige com mão pesada esquecendo de injetar humor (nem que fosse negro) e magia, fatores que seriam essenciais para ajudar a tornar tudo verossímil e desfrutável.
Um filme sobre dois sujeitos que ganham a vida fazendo truques e enganando suas platéias já tem um apelo limitado para começo de conversa. E tudo piora quando percebemos que ambos são extremamente desagradáveis, sujos e misóginos. Hugh Jackman (o Wolverine de “X-Men”) e Cristian Bale (o novo Batman) até tentam dar credibilidade aos seus personagens, mas são derrubados pela pretensão e pela mão pesada do diretor e acabam atuando de maneira composta e forçada (Bale é o mais prejudicado, se perdendo num sotaque esdrúxulo, enquanto Jackman parece “engomado”). O resto do elenco faz mera figuração e desperdiça figuras de peso como Michael Kane e a atual queridinha da crítica, Scarlett Johanson, num papel que não é nada.
“O Grande Truque” tem méritos (como a reconstituição de época e a fotografia) e até consegue manter certo interesse enquanto não revela todos os seus segredos e se concentra na busca pela superação dos mágicos, mas qualquer tentativa de seriedade e credibilidade é sumariamente destruída quando entra em cena uma máquina construída pelo doutor Tesla (o cantor David Bowie, numa composição risível), cujos efeitos são de fazer inveja ao DeLorean que viaja no tempo inventado pelo cientista maluco de “De Volta para o Futuro”. A gente até quer acreditar naquilo tudo, mas como o diretor esqueceu de nos “avisar” que se tratava de um filme de fantasia, o ridículo toma conta e só resta rir do que é mostrado com seriedade e profundidade descabidas.
Adicione a tudo isso uma conclusão nada satisfatória e uma música sem brilho (que apesar de composta por David Julyan traz o nome do canhestro Hans Zimmer na produção, o que sempre é mau sinal) e temos aí mais um filme errado e fora de foco (ao ponto de tentarem esconder que se trata de um filme de época nos cartazes publicitários!). Mais um daqueles tantos que são rapidamente esquecidos e jogados no limbo eterno dos “projetos-interessantes-derrubados-pela-pretensão-do-seu-realizador”...
Cotação: * *
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