Com tanta gente talentosa envolvida no projeto, a gente fica sempre esperando algo mais elaborado, diálogos mais afiados, tramas menos simplórias, mas isso nunca acontece
- por André Lux
A Disney vem enfrentando uma série de problemas com a franquia
Star Wars desde que a comprou a peso de ouro do seu criador George Lucas. Os
novos filmes acabaram sendo mal recebidos por uma grande parcela dos fãs (a
maioria composta por machistas e misóginos obcecados que não aceitam o fato da protagonista
ser uma mulher, verdade seja dita) que passaram a vociferar seu ódio contra a
corporação nas redes sociais fanaticamente.
Depois da má recepção do filme “Han Solo”, que apesar de
divertido é realmente fraco, a Disney entrou numa sinuca de bico e cancelou
vários projetos ligados à saga que deveriam ser exibidos em seu canal de
streaming. Um deles, porém, sobreviveu: a série “The Mandalorian” (O
Mandaloriano, em tradução livre), que obviamente originou-se de algo que
deveria girar em torno do personagem Boba Fett, mas que devido aos problemas
acabou se transformando nas aventuras de um outro mandaloriano (cujo nome só é
revelado no último episódio).
Ao que parece a Disney acertou desta vez, já que a maioria
dos fãs vem louvando a série e dizendo coisas como “isso sim é Star Wars!”. Um
exagero, na minha opinião, pois embora tenha realmente boas qualidades, a série
tem muitos problemas e besteiras que poderiam ter sido facilmente evitados. No
final das contas, não passa de uma animação feita com atores de carne e osso.
A maior qualidade de “The Mandalorian” é retornar a
conceitos básicos de outros filmes e gêneros inseridos nos Star Wars originais
por Lucas, tais como os encontrados em faroestes e filmes japoneses de samurais.
Assim, o protagonista é um caçador de recompensas, como nos Westerns, que
depois cai em desgraça como um Ronin. Isso permite à série usar uma aproximação
minimalista aos personagens que, embora transitem nos mundos futuristas de Star
Wars, poderiam muito bem estar num saloon do velho oeste ou numa aventura no
Japão feudal.
Infelizmente a série tem alguns problemas que a impedem de se
tornar algo além de medíocre. O principal dele é a insistência em fazer o
protagonista agir como um perfeito idiota, algo que destoa completamente da
caracterização que tentam imprimir nele. Uma sequência que ilustra bem isso é
quando Jawas rapinam sua nave (ela não tem proteção, alarme, escudo?) e a
subsequente perseguição que ele faz ao Sandcrawler, escalando-o sem nenhuma
proteção só para ser abatido e jogado pra fora quando chega ao topo. Por sinal,
só essa queda já seria fatal, numa das muitas ocasiões que o Mandaloriano exibe
qualidades de Highlander.
A trama principal gira em torno do resgate de um item
valioso para ex-oficiais do Império (a série se passa depois dos eventos vistos
em “O Retorno de Jedi”) que todos já sabem ser um "bebê Yoda". Não se sabe ainda se é um clone dele ou somente outro ser da mesma raça
do antigo Jedi. E nas ações desse personagem percebemos claramente o caráter
misógino e machista dos ataques de muitos fãs à nova trilogia feita pela Disney.
Ao mesmo tempo que chamam Rey de “Mary Sue” (adjetivo pejorativo usado contra mulheres que exibem poderes, conhecimento e força supostamente incompatíveis com o personagem) quando ela usa a força mesmo sem treinamento, não vemos ninguém dizendo o mesmo quando o “bebê Yoda” faz igual! Lamentável.
Ao mesmo tempo que chamam Rey de “Mary Sue” (adjetivo pejorativo usado contra mulheres que exibem poderes, conhecimento e força supostamente incompatíveis com o personagem) quando ela usa a força mesmo sem treinamento, não vemos ninguém dizendo o mesmo quando o “bebê Yoda” faz igual! Lamentável.
Outro ponto baixo da série é a péssima música composta por Ludwig
Goransson, um compositor talentoso que escreveu boas partituras para filmes
como “Pantera Negra” e “Creed”, mas que aqui certamente foi obrigado a tentar imitar
a paleta musical criada por Ennio Morricone para os faroestes italianos, algo
que simplesmente não funciona no contexto de “The Mandalorian”. O tema
principal associado ao lado mais aventureiro do personagem também é muito ruim
e por demais parecido com o que Goransson criou para “Creed”, que já era algo derivado
do que Bill Conti compôs para os “Rocky” originais.
“The Mandalorian” foi criada pelo ator, roteirista e diretor
Jon Favreu (de “Homem de Ferro”) e dividida
em oito episódios de pouco mais de 40 minutos. A série se perde muito quando se
distancia da trama principal, tendo alguns episódios muito fracos (o pior é o
que treinam fazendeiros para enfrentar mercenários que usam um antigo andador AT-ST
imperial, um dos clichês mais batidos do gênero). Irrita também o fato de o
protagonista deixar o “bebê Yoda” toda hora sozinho na nave ou em outro lugar
sem qualquer proteção, só para gerar suspense.
Os melhores episódios acabam sendo os dois últimos, quando
finalmente começa a ser resolvida a trama central. Mas mesmo assim, muitas
besteiras acontecem, especialmente quando dois stormtroopers conseguem capturar
a preciosa recompensa, mas simplesmente param na entrada da cidade de maneira absurda
só para serem atacados, e na cena em que o temido ex-oficial imperial tem os
protagonistas totalmente cercados, mas resolve dar a eles várias horas para
resolverem se entregar.
O protagonista é feito pelo ator Pedro Pascal, de “Game of
Thrones”, embora poderia ser qualquer um, pois ele passa a série toda usando o
capacete mandaloriano e só é visto por alguns instantes no último episódio (e
sua cara de gaiato não combina com o personagem). O resto do elenco é bastante
irregular e nenhum dos outros coadjuvantes chega a marcar.
Com tanta gente talentosa envolvida no projeto e o valor gasto
em cada episódio a gente fica sempre esperando algo mais elaborado, diálogos
mais afiados, tramas menos simplórias, mas isso nunca acontece de forma
satisfatória. Agora resta aguardar a próxima temporada e torcer para que o
nível melhore, já que a série tem feito bastante sucesso entre os fãs de Star
Wars – um verdadeiro milagre!
Cotação: * * *