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sexta-feira, 17 de abril de 2015

Filmes: "Chappie"

ROBOCOP DOS POBRES

Essa é mais uma batida história de inteligência artificial criando consciência num ser mecânico 

- por André Lux, crítico-spam

É muito ruim esse novo filme do diretor Neill Blomkamp, que chamou a atenção com o interessante "Distrito 9" e logo depois fez o fraco "Elysium". Ele certamente ficou animado com os holofotes que recebeu graças ao seu primeiro longa e resolveu fazer um filme atrás do outro para aproveitar a onda positiva. 

Mas essa estratégia vai acabar virando um tiro no pé, já que a qualidade de seus filmes vem caindo visivelmente e pode decretar um fim abrupto na carreira do sujeito.

Porque fica bem óbvio que ele concebeu esse "Chappie" ainda durante as filmagens de "Elysium", que também mostrava um futuro onde robôs agiam como policiais. Aí ele esticou esse ideia, que por sinal não é nada original, e a transformou em mais uma daquelas histórias que envolvem inteligência artificial criando consciência num ser mecânico que está entre as mais velhas do gênero ficção científica. Acaba sendo uma espécie de "Robocop dos Pobres" ou algo parecido. E é muito similar ao simpático "Short Circuit", de 1986 (chamado de "O Incrível Robô" por aqui) e sua continuação, que também mostrava o robozinho sendo manipulado por ladrões para roubar carros para eles.

Se ao menos o roteiro fosse minimamente inteligente o filme poderia até ser desfrutável, mas é simplesmente pavoroso, repleto de absurdos, falta de lógica e personagem ridículos ou simplesmente desprezíveis. Alguns diálogos são dignos das "melhores" produções trash e ao menos fazem a gente rir quando era para levar a sério. Principalmente quando saem da boca da dupla que faz os traficantes que "adotam" o robô, feita por dois componentes de um grupo de rap sul-africano chamado Die Antwoord que são tão ruins que chega a dar pena. Hugh Jackman, o "Wolverine", também dá um show de canastrice como o vilão que anda de bermuda e usa um penteado de nerd ridículo.

"Mamãe, eu quero ser nerd!"
E que empresa é aquela, que fabrica robôs policiais de última geração, mas não tem segurança nenhuma? Os caras entram e saem a hora que querem levando equipamentos secretos e fica por isso mesmo. O engenheiro vilão ameaça um dos funcionários com uma arma no meio de todo mundo e nada acontece. E assim por diante. 

O robô é até bem feito e em alguns momentos quase convence, mas tudo é destruído pelos diálogos inacreditáveis e a insistência em transformar ele numa espécie de gangster robótico cheio de jinga e malandragem.

E, como de costume, o abominável Hans Zimmer destrói o pouco que resta do filme com uma música totalmente eletrônica que é tão primária e nojenta que nos "melhores" momentos soa como alguém espancando o sintetizador com um gato no cio.

É triste que um cineasta que demonstrou tanta garra e originalidade em seu primeiro filme se perca dessa forma, afinal não é todo dia que a gente tem contato com a cultura sul-africana. Vamos torcer para que ele dê um passo para trás e conceba seus novos projetos com mais carinho e cuidado, sem pressa. E sem Zimmer, por favor... 

Cotação: *

quinta-feira, 2 de abril de 2015

Filmes: "Relatos Selvagens"

PORRADA NA CLASSE MÉDIA

Filme é retrato brutal da mentalidade daquele extrato social que sonha que "um dia vai chegar lá"

- por André Lux, crítico-spam

É impressionante a vitalidade do cinema argentino, sempre pronto a nos surpreender com uma nova produção inusitada e original que quase sempre entretém, mas também faz pensar.

É o caso desse notável "Relatos Selvagens", que é um retrato brutal do que se pode chamar de "mentalidade de classe média", aquele extrato social que acha que vive espremido entre os podres de ricos e os pobres, enquanto sonha que "um dia vai chegar lá" sem perceber que, de fato, está a dez mil passos dos primeiros e a míseros dez dos segundos.

Escrito e dirigido por Damián Szifron, o filme é uma comédia de humor muito negro, que não tem medo de dar uma bela porrada nos classe-medianos e de expor seus maiores defeitos e também o seu retumbante falso moralismo. 
Dividido em seis episódios sem relação um com o outro, "Relatos Selvagens" coloca em cena situações limites que evidenciam algumas das características mais patéticas, violentas, assustadoras ou simplesmente podres das pessoas ditas comuns. Não dá para comentar a fundo os episódios sem estragar as surpresas de cada um deles, mas basta dizer que abordam questões corriqueiras na vida de qualquer um dos autoproclamados "cidadãos de bem" que, pelo jeito, são comuns em qualquer grande metrópole do mundo. Ou seja: os "coxinhas" estão por todos os lados!


O mantra dos coxinhas: "Sou contra 
a corrupção... dos outros, é claro"
Temos ali a propina e a corrupção nossa de cada dia que só gera indignação quando são os outros que as cometem, o desejo de vingança e retaliação que cega e destrói, a alienação política gerando atos de revolta inúteis e autodestrutíveis, a traição como forma de manter relações motivadas por aparências e a incapacidade de lidar com problemas psicológicos de maneira responsável e que joga sempre nos outros a culpa.

Tudo isso vem embrulhado num pacote cinematográfico requintado, com direção e diálogos primorosos, atores excelentes, edição perfeita e, como já disse, um humor negro afiadíssimo e brutal, que chega a chocar em alguns momentos, principalmente nos episódios da briga entre os motoristas e do casamento.

Engraçado é ler as críticas por aí exaltando o filme, mas sem nunca mencionar os ácidos comentários sociais sobre a mentalidade mesquinha e a hipocrisia da chamada classe média. Sinal de que a ironia e o humor finos estão cada vez mais ininteligíveis para a grande maioria das pessoas, infelizmente...

Cotação: * * * * *