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ERRANDO O ALVO
Pretensioso, arrastado e dramaticamente nulo, “O Passado” é mais um daqueles filmes bonitos e bem feitos que acabam se tornando irremediavelmente intragáveis.
- por André Lux, crítico-spam
É uma decepção esse filme do diretor Hector Babenco. Mesmo trabalhando em sua terra natal, a Argentina, e tendo a disposição um ótimo elenco encabeçado pelo mexicano Gael Garcia Bernal, sua adaptação do romance “O Passado”, de Alan Pauls, resulta num filme frio e irritante.
Parece que Babenco, também autor do roteiro, não soube traduzir para a tela o que havia de interessante na história original. No final, ficamos sem saber se o cineasta quis fazer um dramalhão ou um filme de suspense, sendo que ambas as propostas não combinam e, pior, se anulam.
O protagonista interpretado por Bernal não tem qualquer vida e chega a ser apático, transformando-se num “não personagem”. O roteiro episódico e árido nem tenta apontar suas motivações ou conflitos e não ajuda em nada o ator, que passa o filme todo com a mesma expressão, beirando a catatonia. Mesmo depois de ver uma namorada ser atropelada ou ser abandonado pela segunda mulher que o proíbe inclusive de ter qualquer contato com o filho. E tudo fica ainda mais ridículo quando ele “explode” num momento sem qualquer importância – ao ser desprezado por uma coroa rica que transou na academia que dava aulas. Seu vício em cocaína e uma suposta doença que o faz perder a memória também são deixados de lado de maneira completamente inconseqüente.
Personagens entram e saem da narrativa sem deixar qualquer traço de humanidade ou interesse e o filme caminha aos trancos e barrancos até uma conclusão tola e mal amarrada.
Mas pior mesmo é o personagem da primeira ex-mulher, que é retratada pelo cineasta como uma injustiçada que persegue o sujeito o filme inteiro no pior estilo “Amélia é que era mulher de verdade”. Mas a moça não passa de uma histérica obsessiva que precisava era de uma boa terapia e cujas ações absurdas só perdem mesmo para a maluca de “Atração Fatal”.
Pretensioso, arrastado e dramaticamente nulo, “O Passado” é mais um daqueles filmes bonitos e bem feitos que erram feio o alvo e acabam se tornando irremediavelmente intragáveis.
Cotação: *
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segunda-feira, 24 de março de 2008
terça-feira, 4 de março de 2008
DVD: "Blade Runner" (The Final Cut)
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FUTURO DO PRESENTE
Filme mostra sociedade neoliberal dominada por megacorporação que fabricam clones para serem usados como escravos. Mais atual, impossível.
- por André Lux, crítico-spam
É praticamente impossível analisar um filme como “Blade Runner” de maneira objetiva. Primeiro, porque ele tem sido objeto de escrutínio de críticos, especialistas e apreciadores há décadas. Segundo, porque existem dezenas de versões do filme, algumas radicalmente diferentes umas das outras – com e sem narração, com e sem final feliz, com e sem unicórnio, etc. E, dependendo de qual dessas versões você viu primeiro, sua compreensão e sentimentos em relação ao filme podem mudar completamente.
Agora, 26 anos após seu lançamento nos cinemas, o filme de Ridley Scott volta à cena graças ao lançamento da “Versão Final” (Final Cut) engendrada pelo próprio diretor, a qual seria a versão definitiva de “Blade Runner”. Assim, muita gente que detonou o filme na época, hoje se aproveita do status de cult que cerca o filme para se redimir, dizendo que ele só merece sua apreciação agora, depois que tiraram a narração do protagonista e coisas do gênero. Mas não é bem assim e muita gente se gaba atualmente de entender muita coisa só porque já havia assistido à versão antiga com a narração - que era realmente ruim.
Eu, por exemplo, vi “Blade Runner” pela primeira vez em um VHS pirata, por volta de 1984 quando tinha no máximo 14 anos. Nem preciso dizer que não gostei do filme. Naquela época, filme de ficção científica para mim tinha que ser sinônimo de “Star Wars”, ainda mais com Harrison Ford no elenco. Obviamente não estava preparado para entrar no clima noir existencialista da obra. E, convenhamos, o ridículo título “O Caçador de Andróides” que deram ao filme aqui no Brasil não ajudava em nada.
Mas, mesmo não tendo gostado nem entendido, ele ficou na minha cabeça desde então. Talvez pela grandiosidade dos efeitos visuais (que ainda impressionam), pela fotografia revolucionária de Jordan Cronenweth (que gera imitações até hoje), pela música inspirada de Vangelis, pela atuação impecável de todo o elenco (especialmente Rutger Hauer como o replicante Roy Batty) ou pela descrição de um futuro possível para a humanidade (do qual estamos cada vez mais próximos, infelizmente).
A verdade é que “Blade Runner” era um filme muito à frente de seu tempo – o que, na opinião do diretor Ridley Scott, é algo tão ruim quanto estar atrasado no tempo. A visão totalmente sombria de um futuro distópico, onde o planeta foi reduzido a uma terra arrasada sob constante chuva ácida e os animais já estavam extintos, não agradou a platéia daquela época, acostumada com uma leitura mais agradável do futuro da humanidade.
Além disso, Scott estava também à frente do tempo ao mostrar de forma crítica uma sociedade neoliberal ao extremo, completamente dominada por megacorporações, onde o Estado praticamente só existe na forma de polícia e a maioria da população perambula pelas ruas poluídas e congestionadas sem esperança, enquanto os ricos já foram colonizar outros planetas.
Uma sociedade na qual a cereja do bolo é a Tyrell Corporation, especializada na produção de “replicantes” para uso fora da Terra – que nada mais são do que clones humanos, fabricados para realizar trabalho escravo em operações militares, serviços domésticos ou sexuais nas colônias habitadas pelos privilegiados. Como se vê, o filme está mais atual do que nunca.
O interessante, porém, é entender que “Blade Runner” resultou de uma produção extremamente complicada e conturbada. Não havia nem mesmo consenso entre os realizadores a respeito do roteiro a ser seguido, que foi vagamente inspirado no livro “Do Androids Dream of Eletrical Sheep?”, de Phillip K. Dick. O diretor Scott trabalhou no filme como um verdadeiro artista, que muda o tom e o rumo da obra à medida que novas inspirações surgiam em sua mente, fator que deixava toda sua equipe e, principalmente, os executivos do estúdio de cabelos em pé.
A mais famosa controvérsia, que gera polêmica até hoje, é: será que Deckard é também um replicante? Nem mesmo os membros da equipe de produção e do elenco de “Blade Runner” chegam a conclusões iguais nesse tópico, embora seja fato que Scott tenha coberto o filme de dicas que levam a crer que o detetive era realmente um replicante.
Reparem que ele também possui dezenas de fotos espalhadas pelo seu piano, seus olhos brilham na cena anterior ao sexo com Rachel (Sean Young), a fala “Você fez um trabalho de homem” proferida por Gaff (Edward James Olmos) ao final e, claro, o sonho com o unicórnio cujo arco se completa na última cena com o origami deixado pelo mesmo Gaff em seu apartamento.
Muitas dessas dicas são extremamente sutis e propositalmente dúbias, sendo que algumas só fazem sentido e se encaixam na “Versão Final” que traz várias cenas restauradas e lima a narração do protagonista (que, como toda voz em off tosca, não condiz com as atitudes dele).
Particularmente, “Blade Runner” só faz sentido e eleva seu valor se Rick Deckard for mesmo um replicante. A partir do mundo do futuro visualizado por Scott, onde as pessoas são cada vez mais desumanas, miseráveis e apáticas, só mesmo um replicante com implante de memória (ou seja, que não sabe da sua verdadeira condição) pode redimir a humanidade desenvolvendo emoções e valores que já não existem mais naquela sociedade. Sob esse aspecto, o arco vivido por Deckard ao longo do filme serve como um alerta em relação ao tipo de sociedade que construímos e ao mundo que estamos deixando para as futuras gerações.
E, à medida que nos aproximamos do futuro de “Blade Runner”, percebemos o quanto tudo fica mais parecido com o que é retratado no filme. Aquecimento global, poluição, superpopulação, escassez de água e combustíveis, extinção de animais, consumismo desenfreado e o domínio de megacorporações sobre os Estados são apenas alguns dos fatores que estão deixando as pessoas cada vez mais desumanas, apáticas e sem esperança em um mundo que caminha para a autodestruição a passos largos.
A única diferença em relação ao filme é que ainda não existem colônias fora da Terra. Portanto, quando o futuro de “Blade Runner” virar presente, todos vão sofrer as conseqüências...
Cotação: * * * * *
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FUTURO DO PRESENTE
Filme mostra sociedade neoliberal dominada por megacorporação que fabricam clones para serem usados como escravos. Mais atual, impossível.
- por André Lux, crítico-spam
É praticamente impossível analisar um filme como “Blade Runner” de maneira objetiva. Primeiro, porque ele tem sido objeto de escrutínio de críticos, especialistas e apreciadores há décadas. Segundo, porque existem dezenas de versões do filme, algumas radicalmente diferentes umas das outras – com e sem narração, com e sem final feliz, com e sem unicórnio, etc. E, dependendo de qual dessas versões você viu primeiro, sua compreensão e sentimentos em relação ao filme podem mudar completamente.
Agora, 26 anos após seu lançamento nos cinemas, o filme de Ridley Scott volta à cena graças ao lançamento da “Versão Final” (Final Cut) engendrada pelo próprio diretor, a qual seria a versão definitiva de “Blade Runner”. Assim, muita gente que detonou o filme na época, hoje se aproveita do status de cult que cerca o filme para se redimir, dizendo que ele só merece sua apreciação agora, depois que tiraram a narração do protagonista e coisas do gênero. Mas não é bem assim e muita gente se gaba atualmente de entender muita coisa só porque já havia assistido à versão antiga com a narração - que era realmente ruim.
Eu, por exemplo, vi “Blade Runner” pela primeira vez em um VHS pirata, por volta de 1984 quando tinha no máximo 14 anos. Nem preciso dizer que não gostei do filme. Naquela época, filme de ficção científica para mim tinha que ser sinônimo de “Star Wars”, ainda mais com Harrison Ford no elenco. Obviamente não estava preparado para entrar no clima noir existencialista da obra. E, convenhamos, o ridículo título “O Caçador de Andróides” que deram ao filme aqui no Brasil não ajudava em nada.
Mas, mesmo não tendo gostado nem entendido, ele ficou na minha cabeça desde então. Talvez pela grandiosidade dos efeitos visuais (que ainda impressionam), pela fotografia revolucionária de Jordan Cronenweth (que gera imitações até hoje), pela música inspirada de Vangelis, pela atuação impecável de todo o elenco (especialmente Rutger Hauer como o replicante Roy Batty) ou pela descrição de um futuro possível para a humanidade (do qual estamos cada vez mais próximos, infelizmente).
A verdade é que “Blade Runner” era um filme muito à frente de seu tempo – o que, na opinião do diretor Ridley Scott, é algo tão ruim quanto estar atrasado no tempo. A visão totalmente sombria de um futuro distópico, onde o planeta foi reduzido a uma terra arrasada sob constante chuva ácida e os animais já estavam extintos, não agradou a platéia daquela época, acostumada com uma leitura mais agradável do futuro da humanidade.
Além disso, Scott estava também à frente do tempo ao mostrar de forma crítica uma sociedade neoliberal ao extremo, completamente dominada por megacorporações, onde o Estado praticamente só existe na forma de polícia e a maioria da população perambula pelas ruas poluídas e congestionadas sem esperança, enquanto os ricos já foram colonizar outros planetas.
Uma sociedade na qual a cereja do bolo é a Tyrell Corporation, especializada na produção de “replicantes” para uso fora da Terra – que nada mais são do que clones humanos, fabricados para realizar trabalho escravo em operações militares, serviços domésticos ou sexuais nas colônias habitadas pelos privilegiados. Como se vê, o filme está mais atual do que nunca.
O interessante, porém, é entender que “Blade Runner” resultou de uma produção extremamente complicada e conturbada. Não havia nem mesmo consenso entre os realizadores a respeito do roteiro a ser seguido, que foi vagamente inspirado no livro “Do Androids Dream of Eletrical Sheep?”, de Phillip K. Dick. O diretor Scott trabalhou no filme como um verdadeiro artista, que muda o tom e o rumo da obra à medida que novas inspirações surgiam em sua mente, fator que deixava toda sua equipe e, principalmente, os executivos do estúdio de cabelos em pé.
A mais famosa controvérsia, que gera polêmica até hoje, é: será que Deckard é também um replicante? Nem mesmo os membros da equipe de produção e do elenco de “Blade Runner” chegam a conclusões iguais nesse tópico, embora seja fato que Scott tenha coberto o filme de dicas que levam a crer que o detetive era realmente um replicante.
Reparem que ele também possui dezenas de fotos espalhadas pelo seu piano, seus olhos brilham na cena anterior ao sexo com Rachel (Sean Young), a fala “Você fez um trabalho de homem” proferida por Gaff (Edward James Olmos) ao final e, claro, o sonho com o unicórnio cujo arco se completa na última cena com o origami deixado pelo mesmo Gaff em seu apartamento.
Muitas dessas dicas são extremamente sutis e propositalmente dúbias, sendo que algumas só fazem sentido e se encaixam na “Versão Final” que traz várias cenas restauradas e lima a narração do protagonista (que, como toda voz em off tosca, não condiz com as atitudes dele).
Particularmente, “Blade Runner” só faz sentido e eleva seu valor se Rick Deckard for mesmo um replicante. A partir do mundo do futuro visualizado por Scott, onde as pessoas são cada vez mais desumanas, miseráveis e apáticas, só mesmo um replicante com implante de memória (ou seja, que não sabe da sua verdadeira condição) pode redimir a humanidade desenvolvendo emoções e valores que já não existem mais naquela sociedade. Sob esse aspecto, o arco vivido por Deckard ao longo do filme serve como um alerta em relação ao tipo de sociedade que construímos e ao mundo que estamos deixando para as futuras gerações.
E, à medida que nos aproximamos do futuro de “Blade Runner”, percebemos o quanto tudo fica mais parecido com o que é retratado no filme. Aquecimento global, poluição, superpopulação, escassez de água e combustíveis, extinção de animais, consumismo desenfreado e o domínio de megacorporações sobre os Estados são apenas alguns dos fatores que estão deixando as pessoas cada vez mais desumanas, apáticas e sem esperança em um mundo que caminha para a autodestruição a passos largos.
A única diferença em relação ao filme é que ainda não existem colônias fora da Terra. Portanto, quando o futuro de “Blade Runner” virar presente, todos vão sofrer as conseqüências...
Cotação: * * * * *
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