terça-feira, 25 de março de 2025

“Adolescência” mostra como a extrema-direita torna jovens desajustados em potenciais assassinos

Série é um soco no estômago que serve como alerta para sobre o tipo de pessoas que estão sendo criadas nos submundos da internet

- por André Lux, crítico-spam

A minissérie “Adolescência”, produzida pela Netflix, é um soco no estômago que serve como um aterrador alerta para pais e educadores sobre o tipo de jovens que estão criados nos submundos da internet, onde predomina a ideologia machista, misógina e violenta da extrema-direita que prega, entre outras barbaridades, que a culpa pela incapacidade de alguns homens se relacionarem com mulheres é do feminismo.

Dividida em quatro capítulos, a série possui apenas quatro longos planos-sequências filmados sem corte de maneira inacreditável, num esforço hercúleo dos realizadores. Mas esta escolha vai muito além de uma mera firula estética, pois a movimentação constante da câmera em torno dos atores e suas interações gera um clima de suspense e ansiedade.

No primeiro episódio acompanhamos a prisão do adolescente Jamie, de 13 anos, sua viagem até a delegacia e o interrogatório. No segundo, seguimos a visita dos policiais até a escola na qual o jovem estudava, onde tentam entender suas motivações. No terceiro, é a vez da visita de uma psicóloga até a prisão e suas tentativas de entrar na psiquê do adolescente a fim de traçar seu perfil psicológico. E no último, testemunhamos as consequências das ações do rapaz na vida de sua família, principalmente o pai (Stephen Graham, também um dos autores da série).

O grande mérito de “Adolescência” é não fazer julgamentos, nem tentar justificar os atos do garoto, mas sim mostrar a realidade dos fatos para que o espectador tire suas próprias conclusões. Embora não seja baseado em um fato específico, o roteiro faz um apanhado de vários casos reais no Reino Unido envolvendo adolescentes “INCELS” que cometeram atos violentos contra mulheres.

O termo “INCEL” significa “involuntary celibates” (celibatários involuntários) ou seja, jovens membros de uma subcultura virtual que se definem como incapazes de encontrar um parceiro romântico ou sexual, apesar de desejarem ter. Quando eu tinha essa idade, éramos conhecidos como “virgens” e sentíamos a mesma frustração ao não conseguir “pegar mulheres” como os outros faziam. Mas as semelhanças param por aí.

Não sou reacionário que sonha com a volta “daquela época onde as coisas eram melhores”, mas é inegável que os “virgens” de outrora, embora frustrados e depressivos, não sentiam ódio pelas mulheres ou pela luta delas por direitos iguais como os atuais Incels. A gente ficava chateado, achando que a culpa era nossa mesmo por sermos feios ou desajeitados para os “jogos do amor” e vida que segue.

O que mudou? A mudança veio com a invasão de gurus da extrema-direita que, a fim de manipular os jovens em direção ao fascismo e à defesa de valores machistas, saem por aí afirmando que eles não conseguem transar por causa do feminismo e das mulheres mesmo, que são todas interesseiras e superficiais (um deles é inclusive citado nominalmente). A série aborda isso de forma sutil ao mostrar as publicações do protagonista em seu Instagram e o comentário de muitos jovens, chamando-o de “Incel”, “Red Pill” e outros termos associados à ideologia machista vomitada por extremistas de direita, fatores que passam batidos para a maioria dos adultos, inclusive para os policiais.

E já existem estudos que demonstram isso de forma cabal, confira neste link: They Walk Among Us: Misogyny, Right-Wing Authoritarianism and Social Dominance Orientation Predict the Endorsement of Incel Ideologies (Misoginia, Autoritarismo de Direita e Orientação de Predominância Social Predispõe a Aceitação da Ideologia Incel).

Os dois episódios mais impactantes são o terceiro, onde o jovem assume seu machismo, misoginia e agressividade frente à psicóloga, e o último, onde vemos a família dele sendo aos poucos destruída pela culpa e pelos ataques que sofrem da comunidade. Neste segmento a série levanta o questionamento a cerca do que pais e educadores devem fazer em relação aos limites da liberdade que os adolescentes devem ter ao acessar a internet. “Nós demos um computador a ele e achamos que ele estava seguro aqui dentro de casa, em seu quarto, mas a verdade é que ele não estava seguro. Será que nós deveríamos ter feito mais?”, questiona a mãe do adolescente numa das cenas mais tocantes.

O desespero do pai cujo filho foi cooptado pelo extremismo de direita

A realidade é que a enxurrada de gurus de extrema-direita na internet vem envenenando a mente da atual geração e isso passa desapercebido para a maioria dos pais e educadores. Muitos, inclusive, acham ótimo que seus filhos fiquem com a cara enfiada em celulares e computadores já que assim não os incomodam. Mas existem pais que querem ajudar seus filhos a não caírem nessa armadilha, porém simplesmente não sabem o que fazer já que, ao tentarem desviar a atenção dos jovens para atividades mais nobres como leitura, arte ou esportes, vão despertar a fúria deles tamanho o nível de viciamento que as redes proporcionam na mente.

Uma situação bastante complicada e que precisa ser encarada com a importância que exige. Porque depois não vai adiantar chorar o leite derramado...

Cotação: ***** 

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