sábado, 30 de setembro de 2017

Série: "13 Reasons Why" (Os 13 Porquês)

GRITO DE ALERTA

Suicídio de adolescente expõe sociedade doente e desumana, em que as pessoas são apenas números e as relações se dão por interesses egoístas

- por André Lux, crítico-spam

A série “13 Reasons Why” (“Os 13 Porquês”) aborda de forma direta e realista um tema tabu em nossa sociedade: o suicídio. Trata-se de uma produção da cantora Selena Gomez inspirada no livro de Jay Asher e adaptado para as telas pelo dramaturgo Brian Yorkey. Narra as razões pelas quais Hanna Baker, uma adolescente de 17 anos, diz ter sido levada a tirar a própria vida. Gravadas em fitas cassetes antigas e enviadas postumamente, as mensagens responsabilizam os colegas de convívio pelo desfecho trágico.

A série provocou forte polêmica, com várias pessoas alegando que ela pode estimular ainda mais o suicídio, que segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) mata atualmente um milhão de pessoas por ano (uma a cada 40 segundos), o que equivale a 1,4% dos óbitos totais, sendo que cerca de 75% ocorrem em países de renda média e baixa (mais informações neste link). O principal motivo apontado pelos seus detratores é de que série teria “glamourizado” o suicídio, mostrando as fitas gravadas pela jovem como uma forma de se vingar daqueles que supostamente a teriam levado a tirar a própria vida, fator que pode provocar o chamado efeito Werther, termo científico pelo qual a publicidade de um caso notável serve de estímulo a novas ocorrências.

O psiquiatra Luís Fernando Tófoli, por exemplo, chegou a elaborar 13 parágrafos para alertar sobre os perigos da série. “O programa tem o potencial de causar danos a pessoas que estão emocionalmente fragilizadas e que poderão, sim, ser influenciadas negativamente. Não é absurdo inclusive considerar que, para algumas pessoas, a série possa induzir ao suicídio. Portanto, pessoas em situações de risco deveriam ser desencorajadas a assistir a série”, afirma o médico em seu artigo (leia a íntegra neste link).

Confesso que esse é um tema bastante delicado para qualquer pessoa que, como eu, sofre de Depressão e já teve pensamentos, tentativas de tirar a própria vida ou casos de suicídio entre familiares e amigos. Nesse sentido, “13 Reasons Why” não é um prato fácil de digerir, pois aborda a questão sem medo de colocar o dedo na ferida, elencando de forma bastante didática todos os acontecimentos trágicos que levaram a jovem Hanna a se matar.

Será que a série teria mesmo essa capacidade de estimular o suicídio? A resposta é complexa e, embora entenda perfeitamente os alertas feitos pelos especialistas, acho que ela pode também salvar vidas. O Centro de Valorização da Vida (CVV) relatou ter percebido um aumento de aproximadamente 100% no número de mensagens de texto e ligações de pessoas dispostas a conversar sobre o suicídio. De acordo com a instituição, muitos desses relatos mencionam a trama, que tem como fio condutor a morte de Hannah Baker (leia mais neste link).

Enfim, é uma faca de dois gumes. Se você aborda de forma direita um tema “proibido” desse tipo, corre o risco de estimular novos casos, mas se joga pra baixo do tapete, como faz a maioria das pessoas, certamente não vai ajudar em nada as pessoas que estão sofrendo e pensando em tirar a própria vida. Um dos principais motivos que leva alguém a cometer tal ato é certamente a sensação de isolamento e solidão, fatores que elevam à enésima potência os problemas que a levam tal estado e à Depressão. Ao assistir uma série como “13 Reasons Why”, essa pessoa pode entender que não está só, que não é a única a estar naquela situação sentindo o que sente, e isso pode amenizar sua dor e colocá-la em uma perspectiva menos desesperante.


Dificuldade de comunicação franca e aberta leva a tragédias
Sobre a série em si, que é uma obra de ficção, posso dizer que é muito bem feita e prende a atenção do começo ao fim, embora estique algumas situações além da conta para aumentar o tempo de duração. Não acho que glamourize o suicídio, pelo contrário, penso que mostra com riqueza de detalhes as angústias, pressões e abusos sofridos pelos adolescentes, principalmente dentro da cultura estadunidense, onde a maior ofensa é ser chamado de “perdedor” (looser), cultura essa que já foi exportada com sucesso para grande parte do mundo, especialmente o Brasil.

No final das contas, trata-se de um pertinente grito de alerta em uma sociedade cada dia mais doente e desumana, em que as pessoas são vistas apenas como números ou estatísticas e as relações se dão cada vez mais apenas por valores egoístas e de interesse. A imensa dificuldade de comunicação franca e aberta entre as pessoas, especialmente entre pais e filhos, também é um dos fatores apontados pela série como desencadeadores de mal entendidos que levam a tragédias.

As perguntas que mais se escutam ditas por familiares e amigos de pessoas que se mataram é: “Por que ela fez isso? Por que ninguém percebeu os sinais?”. “13 Reaons Why” dá uma pista das respostas e, acreditem, os sinais são muito fáceis de serem percebidos, porém poucos tem a empatia e o interesse necessários para enxergá-los, muito menos para dar a mão a quem precisa de ajuda. Depois não adianta chorar. Afinal, como diz a chamada da série, “se você está ouvindo isso, já é tarde demais”...

Cotação: * * * *

sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Filmes: "IT - A Coisa"

NÃO É UMA OBRA-PRIMA DO MEDO

Apesar de bem feito, filme acaba sendo episódico e repetitivo

- por André Lux, crítico-spam

Essa é a segunda adaptação para as telas do livro gigantesco (mais de mil páginas!) “IT – A Coisa” que Stephen King escreveu em 1986, segundo dizem no auge do seu vício em cocaína. A primeira foi uma minissérie de 6 horas de duração, dividia em dois capítulos e cujo subtítulo era o ridículo "Uma Obra-Prima do Medo". Na época fez sucesso, mas analisada hoje percebe-se que era bem ruim, especialmente a segunda parte com os adultos.

Chega agora uma nova versão para os cinemas, mais bem produzida e que se fixa apenas nas crianças e suas desventuras. Todavia é bom alertar que o filme não tem uma conclusão e mostra só no início dos créditos finais ser o “Capítulo I”, algo que não me parece muito honesto de ser feito, já que omite do espectador que trata-se apenas da primeira parte de um filme duplo, cuja explicação e resolução só vão surgir no “Capítulo II”.

Enfim, enganações à parte, o novo “IT – A Coisa” é certamente muito melhor que a minissérie, mais bem produzido e atuado, porém ainda assim fica num meio termo e a melhor cena é a que já havia sido mostrada no trailer, a do menino e o palhaço no bueiro. As razões são várias, a começar pela dificuldade em se adaptar as obras de King para o cinema, já que seus livros são muito mais calcados nos medos interiores dos personagens do que em cenas de terror meramente visuais.

Segundo porque não é muito bem conduzido e acaba sendo episódico. às vezes parece que estamos vendo dois filmes diferentes. Um sobre o despertar dos jovens para a adolescência e outro de puro terror. Muitas vezes a narrativa pula de um tema para o outro sem muita lógica. Há também um excesso de piadinhas disparadas por um dos garotos (o ator é o protagonista de “Stranger Things”) que simplesmente não funcionam na maior parte das vezes, ainda mais naquele contexto de terror e violência.

Outro problema é justamente a semelhança da obra com tantas outras, desde “Conta Comigo” do próprio King, até as atuais “Super 8” e “Stranger Things”, que são obviamente inspiradas em “IT”. No final acaba sendo uma espécie de “Goonies” versus “Freddie Krugger” com pitadas de “Poltergeist”, mas com defeitos na estrutura que prejudicam o resultado final. 


O maior deles é que nunca ficam claros quais os limites e alcances dos poderes da entidade maligna que persegue os habitantes da pequena cidade, o qual se manifesta na maior parte das vezes como o palhaço Pennywise, feito por Bill Skarsgård destacando apenas a faceta assustadora dele, bem diferente da atuação de Tim Curry na minissérie para a TV. 


Tim Curry e Bill Skarsgård como Pennywise
Em algumas cenas, como a do bueiro, ele primeiro parece ter que seduzir a criança para ir até ele e então a ataca ferozmente, enquanto em outras ele parte direto pra cima, mas deixa as vítimas escaparem sem lógica. E em outra sequência ele atrai um dos meninos para a casa abandonada, o aterroriza na forma de um mendigo infestado por doenças para depois aparecer como o palhaço e ficar só olhando pra ele sinistramente enquanto segura balões. No fim, ele parece inclusive dominar a mente das pessoas, obrigando-as a fazer maldades, algo que parece ser recorrente no livro.

Enfim, não é essa obra-prima do medo que muitos críticos histéricos estão apontando, mas também não chega a ser ruim. Não consegue fugir de alguns clichês mofados do gênero (como a mocinha em perigo, algo que não existe no livro) e acaba apenas sendo um pouco longo, repetitivo e falha em não ser capaz de explicar de forma clara as regras daquele mundo, algo que é essencial para gerar suspense a partir da empatia com os protagonistas.

Cotação:
* * *

sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Filmes: "Planeta dos Macacos: A Guerra"

MACACO REDUNDANTE

César, certamente um dos protagonistas mais interessantes dos tempos atuais, merecia mais em sua despedida.

- por André Lux, crítico-spam

Depois de um início titubeante com “A Origem” e de um segundo capitulo excelente, “O Confronto”, o “reboot” da franquia “Planeta dos Macacos” termina de forma decepcionante com “A Guerra”. É verdade que seria mesmo muito difícil superar o filme anterior, uma das melhores e mais surpreendentes super-produções do cinema comercial estadunidense, mas bem que poderiam ter tentado criar um roteiro melhor elaborado e impactante. 

Infelizmente apostaram em reciclar as idéias e situações de “O Confronto”, como se todo o arco vivido pelo macaco César não tivesse acontecido, pecado mortal de muitas continuações feita em Hollywood. Por causa disso, “Planeta dos Macacos: A Guerra” acaba se tornando redundante, já que o protagonista tem que reviver praticamente os mesmo confrontos e dilemas morais do filme anterior, o que deixa narrativa frouxa e arrastada, principalmente no segundo ato quando vira filme de prisão, com direito a várias cenas de tortura e sofrimento.

Há também um excesso de citações ao cristianismo e a outros filmes como o “Planeta dos Macacos” original de 1968, “Apocalipse Now” e “A Ponte do Rio Kway” que, embora sejam divertidas para os cinéfilos, pouco acrescentam ao resultado final, sendo que algumas até atrapalham. É o caso do Coronel obcecado em aniquilar os macacos, numa citação direita ao personagem vivido por Marlon Brando no filme de Coppola, mas que não funciona e por vezes beira o ridículo. Primeiro porque Woody Harrelson não tem o peso necessário para o papel, sendo mais adequado para comédias, e segundo porque o personagem é mal desenvolvido e suas motivações soam forçadas e inconvincentes, ainda mais da forma que são apresentadas em longos discursos expositivos proferidos por ele para César.

A falta de humanos interessantes no filme, defeito que já existia no segundo capítulo em menor escala, também prejudica a narrativa, pois impede que seja criado o conflito necessário para gerar suspense ou empatia. Aqui todos são soldados malvados, caricaturas unidimensionais do que existe de pior na raça humana. Teria sido bem melhor se os personagens do filme anterior tivessem sido reaproveitados, o que certamente aumentaria o interesse. A única pessoa que desperta certa compaixão é uma menina muda que os macacos encontram e adotam, mas o final é outro personagem que não acrescenta nada. A melhor coisa acaba sendo o “Macaco Mau”, feito pelo comediante Steve Zahn, que ao menos traz algum humor e leveza a um filme por demais pesado e sério. 

O impressionante Maurice e sua humana adotiva
O filme desanda de vez no ato final, quando uma série de “deus ex machina” são usados para movimentar a trama e salvar os macacos das ameaças, algo que demonstra o quanto os realizadores estavam perdidos na tentativa de encerrar a trilogia. A cena derradeira então não tem qualquer impacto e falha em passar emoções.

Meu texto pode dar a impressão que o filme é ruim, desagradável. Não é. Ainda tem muitas qualidades, a começar pelos efeitos visuais que deram vida aos símios que são simplesmente impressionantes, particularmente o orangotango Maurice. A música de Michael Giacchino continua muito boa, em especial quando usa percussão, e a fotografia do consagrado Michael Seresin mantém a mesma qualidade do filme anterior. É uma pena que não conseguiram bolar um roteiro mais inteligente e original que ao menos não virasse uma cópia do segundo filme. O macaco César, certamente um dos protagonistas mais interessantes dos tempos atuais, merecia mais em sua despedida.

Cotação: * * *

quinta-feira, 3 de agosto de 2017

Filmes: "Dunkirk"

PASTEL DE VENTO COM BRITADEIRA

Christopher Nolan tenta dar uma de Terrence Malick e falha fragorosamente

- por André Lux, crítico-spam


Quem acompanha minhas críticas já sabe que não sou um dos admiradores incondicionais do diretor Christopher Nolan. Dele só gostei mesmo de “Amnésia” e dos dois primeiros “Batman”, mesmo assim com sérias restrições. Acho ele pretensioso demais e dono de uma mão pesada que deixam seus filmes sutis como um elefante correndo numa loja de cristais. E esse “Dunkirk” não foge à regra.

Aqui Nolan pretende dar uma de Terrence Malick, o recluso cineasta estadunidense que fez jóias como “Além da Linha Vermelha” e “Days of Heaven”, ao contar a trágica história do cerco da cidade francesa de Dunkirk durante a segunda guerra mundial, quando soldados franceses, belgas e ingleses ficaram presos à beira da praia, cercados pelos nazistas enquanto esperavam algum tipo de resgate. Ou seja, ao invés de optar por uma maneira mais trivial, Nolan tenta produzir uma experiência cinematográfica basicamente sensorial, com um mínimo de diálogos e contando quase sempre com imagens, atuações do elenco, som e música para captar os horrores da guerra. E, verdade seja dita, falha fragorosamente.

Primeiro porque Nolan não é Malick e, portanto, não chega nem perto do domínio técnico dele para captar imagens impressionantes do ponto de vista estético. Embora não seja ruim, a fotografia do filme é medíocre e não traz nada de novo ao gênero, cujo ápice certamente foi atingido por Spielberg no claudicante, porém tecnicamente brilhante, “O Resgate do Soldado Ryan”, cuja cena de batalha na abertura é inigualável até hoje. 

Segundo porque Nolan é um diretor de atores fraco. Basta ver como ficam todos parecendo zumbis, sempre com a mesma expressão catatônica, ao ponto da gente nem conseguir distinguir direito um personagem do outro. Sei que estavam todos esgotados física e mentalmente, porém não é por isso que deixariam de expressar emoções, que aqui ficam longe de serem registradas.

E terceiro e mais gritante, claro, é a trilha musical composta pelo abominável Hans Zimmer, que certamente é uma das coisas mais bisonhas que ele já pariu em sua já longa e pavorosa carreira. Basicamente, ele colocou para tocar o tema do Coringa do segundo “Batman” durante toda a projeção. Para quem não sabe, em “O Cavaleiro das Trevas” Zimmer criou um tema para o Coringa que é de um simplismo de dar dó: nada mais do que um zumbido de uma nota só tocada pelo cello, sampleado e acompanhado por guinchos de guitarra e sons que se assemelham a alguém jogando um gato em cima do sintetizador. Esse zumbido insuportável é, de vez em quando, entrecortado por um som semelhante ao tic-tac de um relógio, como se fosse para dar uma sensação de urgência que até poderia ser interessante ou mesmo original caso Ennio Morricone já não tivesse usado esse efeito com maestria em 1973 no filme “Meu Nome é Ninguém”. Quando precisa tentar dar alguma emoção ao filme, Zimmer entra com um tema sintético bombástico que soa como algo que Vangelis poderia ter produzido caso estivesse no meio de uma grave crise intestinal. Enfim, um desastre dantesco que literalmente implode o filme de quaisquer pretensões que tenta atingir (basta ver “Além da Linha Vermelha”, cuja temática é semelhante, para perceber que até um picareta como Zimmer consegue dar seu melhor sob o comando de um verdadeiro cineasta, no caso Terrence Malick).

Zimmer: imortalizando a máxima "nada se cria, tudo se copia"

Não bastasse tudo isso, a montagem também não convence, deixando o filme arrastado e difícil de seguir (as cenas de perseguições entre os aviões são inacreditavelmente desconjuntadas e tediosas). Em alguns momentos falhas gritantes de continuidade saltam aos olhos, como na cena em que o oficial feito por Kenneth Branagh olha para um avião com o sol brilhando forte atrás dele, mas no corte seguinte o mesmo avião passa sob um céu completamente nublado. Ou quando um navio tomba e bate no cais esmagando soldados, mas na sequência aparece há mais de 20 metros do mesmo local.

O roteiro, escrito apenas por Nolan (geralmente seu irmão participa), é pífio e divide a ação em três situações e tempos narrativos que servem apenas para deixar o filme confuso. E o diretor erra também ao pular de um ponto para outro nos momentos de maior tensão, acabando com qualquer tentativa de criar suspense. Os diálogos são muito ruins, empolados e artificiais e muitas vezes repletos de pseudo-profundidade que soam ainda mais ridículos vindos de garotos à beira da morte.

Assim como “Interestelar”, esse é mais um pastel de vento produzido por um cineasta apaixonado pelo próprio umbigo, mas que desta vez inovou nos forçando a ingerir tal iguaria sonsa ao som de algo que parece ser uma britadeira (é sério, em alguns momentos eu achei que estavam fazendo alguma obra fora do cinema, cortesia do sr. Zimmer). Os trágicos eventos de Dunkirk estão muito melhor registrados no maravilhoso “Desejo e Reparação” em uma cena breve, porém de impacto emocional arrebatador, algo que esse filme metido a besta passou longe de atingir. Mas muito longe.

Cotação: * 1/2

segunda-feira, 19 de junho de 2017

SEJA UM PADRINHO DO TUDO EM CIMA!

Contribua com o Tudo Em Cima! 

Para isso, basta você clicar no botão abaixo e ir para o site Padrim, onde poderá escolher a melhor forma de "apadrinhar" o meu blog. Pode ser pagamento via boleto ou no cartão de crédito, nos valores que desejar. 
Clique na imagem e vá para o site de apadrinhamento


sexta-feira, 16 de junho de 2017

Filmes: "The Wizard of Lies"

RETRATO DE UM PSICOPATA

Filme mostra como o mundo dos negócios e o capitalismo neoliberal são perfeitos para que predadores deitem e rolem

- por André Lux, crítico-spam

“The Wizard of Lies” (O Mago das Mentiras, em português) é um filme produzido pelo canal HBO sobre a vida de Bernie Madoff, um dos papas da bolsa de valores estadunidenses que na verdade era um grande enganador o qual construiu um esquema fraudulento de investimentos que no final arruinou a vida de milhares de pessoas.

Dirigido pelo veterano Barry Levinson (de “Sleepers”) e com Robert De Niro no papel do protagonista, o filme é baseado no livro da jornalista Diana B. Henriques que entrevistou Madoff na prisão. Mais do que o retrato de um psicopata, “The Wizard of Lies” mostra como o mundo dos negócios e, em última instância, o sistema capitalista neoliberal são perfeitos para que esse tipo de predador humano deite e role sobre a vida de milhões de pessoas sem qualquer tipo de controle. Em uma das cenas mais marcantes da obra, um dos filhos de Madoff é questionado pela agente do FBI como não poderia saber das fraudes perpetradas pelo pai, ao que ele responde: “Se vocês que deveriam saber de tudo, vigiar tudo, não sabiam, como é que eu ia saber?”.

O filme nem tenta fazer entender os motivos que levaram Madoff a fazer o que fez, até porque fica claro que ele realmente não tinha motivo algum, exceto aquela máxima: “Fiz porque podia”. De Niro tem uma atuação contida e que muito revela sobre a verdadeira natureza do personagem, que praticamente nunca muda de expressão nem demonstra qualquer tipo de empatia, compaixão ou remorso por suas vitimas, nem mesmo pela família que é destruída por suas ações – um dos filhos acaba de suicidando, o outro morre de câncer alguns anos depois e a esposa (Michelle Pfeifer) vive de favor da casa da irmã, na Flórida. Chega a afirmar que é mais feliz vivendo na prisão.

O único momento em que ele tem algum tipo de reação é quando fica indignado ao ser comparado em um grande jornal com Ted Bundy, um serial killer que matava e colecionava a cabeça de suas vítimas. “Como podem me comparar a esse sujeito? Você acha que eu sou um sociopata?”, questiona na cena final à jornalista. Basta olhar as fotos do verdadeiro Madoff e reparar na expressão de tubarão em seus olhos para saber a resposta.


Madoff e o olhar do tubarão neoliberal
O que nos faz perguntar: quantos Bernie Madoff estão por aí, à solta, no mundo dos negócios, na política e nas grandes corporações, tomando decisões por todos nós e empurrando a raça humana cada vez mais rumo ao abismo? Melhor nem pensar nisso, é assustador demais...

Cotação: * * *

domingo, 4 de junho de 2017

Filmes: "Mulher-Maravilha"

MULHER-ASSASSINA

O melhor é não passar nem perto dessa besteira, principalmente as crianças que deveriam ser o público alvo do gênero


- por André Lux, crítico-spam

A DC bem que tentou, mas ainda não foi desta vez que conseguiu produzir um filme baseado nos seus super-heróis em quadrinhos que consiga limpar a imagem péssima que conquistou com os anteriores, principalmente “Homem de Aço” e “Batman versus Superman”, dois dos filmes mais grotescos já lançados até hoje no gênero.

Obviamente os executivos da Warner leram a enxurrada de críticas dos fãs que, em sua grande maioria, abominaram as adaptações mais recentes e tentaram a todo custo elevar o nível nesse “Mulher-Maravilha”. Para isso, contrataram uma mulher para dirigir o filme, Patty Jenkins (de “Monstro”), e criaram um roteiro que é quase uma cópia carbono do primeiro “Capitão América”, tanto em termos de estrutura, quanto de motivações e até vilões (os alemães). Copiaram também o esquema de "peixe fora da água" e as tentativas de humor do primeiro "Thor". Mas não deu muito certo, embora seja realmente um pouco melhor que os outros da DC, o que não chega a ser um grande elogio dada a ruindade daqueles filmes.

“Mulher-Maravilha” começa mostrando ela ainda criança na ilha das amazonas querendo de qualquer jeito aprender a lutar com a tia Antíope (Robin Wright, desperdiçada), enquanto sua mãe a rainha faz de tudo para impedir. Só que essa atitude da mãe não tem qualquer lógica, afinal ela é uma deusa e seria muito mais razoável treiná-la desde cedo para enfrentar seu destino, já que ela foi criada para ser a última defesa contra o deus-vilão Áres, cuja identidade secreta fica óbvia desde o primeiro momento para qualquer um que já tenha visto esse tipo de filme mais de uma vez na vida. Enfim, essa sub-trama é uma perda de tempo de projeção, já que ela é treinada de qualquer jeito até crescer. Aí começa o segundo grande problema do filme, já que a protagonista passa a ser interpretada por Gal Gadot, uma dessas mulheres-palito que fazem a cabeça dos estilistas de moda atualmente. A moça, que foi "revelada" num desses "Velozes e Furiosos", é uma atriz muito limitada, o que fica evidente quando tenta demonstrar alguma emoção.

A terceira e maior falha é algo que infesta muitos filmes de super-heróis atualmente: a gente nunca fica sabendo quais são os poderes da “Mulher-Maravilha” ou suas limitações. Assim, do nada ela se transforma de uma garota que é facilmente derrubada pela tia a uma guerreira praticamente invencível, capaz até de pular mais que uma pulga superdesenvolvida e resistir a impactos brutais contra rochas e estruturas de ferro - mas aparentemente não a balas, já que é quase morta em várias cenas em que atiram contra ela. Não adianta dizer que é assim porque ela não sabia que tinha poderes, pois nunca é sinalizado que ela precisa desenvolver tais poderes. Ela os tem e pronto, começa a usar do nada, como se já soubesse que os tinha quando assim exige o roteiro. Isso tira qualquer suspense, já que não existem regras definidas, ou seja, vale tudo. Basta assistir ao maravilhoso “Superman – O Filme”, de 1978, para entender como se deve apresentar de forma adequada e muito simples os poderes e limites de um super-herói.

O coitado do Chris Pine (o Kirk dos novos “Star Trek” e que está em tudo quanto é filme) fica com a ingrata tarefa de ser um mero “homem-exposição”, já que seu personagem serve apenas para ficar explicando forçadamente a trama para a protagonista e, claro, para a plateia. Tentam um romance entre os dois, porém eles não demonstram qualquer química e o personagem de Pine é vazio demais até para gerar empatia, o que seria imperioso para que a catarse final funcionasse. O resto do elenco é fraco, com destaque negativo para o péssimo Danny Huston, eterno canastrão especialista em vilões e que foi o Striker no fraco “X-Men Origens: Wolverine”. 


Mulher-Maravilha ou Mulher-Palito?
A fotografia é escura, esmaecida (embora um pouco mais colorida que os filmes do Superman) e o desenho de produção é carnavalesco, principalmente na ilha das amazonas. A trilha musical é composta por um dos incontáveis discípulos do abominável Hans Zimmer, no caso um tal de Rupert Gregson-Williams (mas podia ser qualquer outro), e é aquela coisa horrorosa de sempre: bombástica, ensurdecedora, opressiva e sem qualquer tipo de nuance ou desenvolvimento temático – e ainda somos obrigados a ouvir o tema que Zimmer inventou para a “Mulher Maravilha” no famigerado “Batman versus Superman” que, como afirmei na minha análise daquele filme, ficaria bem para acompanhar as aventuras do “Chapolin Colorado”, de tão ridículo.

No final chegam ao cúmulo de mostrar a protagonista assassinando a sangue-frio uma pessoa desarmada, igual ao que fez o Superman em “Homem de Aço”, o que é um exemplo tenebroso para qualquer criança em mais um tiro no pé que só pode ser atribuído ao lamentável Zack Snyder, que aqui assina apenas como criador da estória e produtor. E mais uma vez somos atormentados por uma daquelas lutas entre dois seres supostamente imortais que, entre tapas e socos, soltam raios e causam explosões capazes de provocar um ataque epiléptico nos mais sensíveis.

Incrivelmente o filme vem recebendo ótimas críticas mundo afora, o que apenas demonstra delírio coletivo dos profissionais da opinião ou então uma vontade muito grande de acreditar que a DC conseguiu finalmente fazer um filme divertido como os da Marvel, o que não é nem de longe uma verdade. Alguns estão enxergando no filme um tratado feminista, mas sinceramente isso não faz sentido porque o fato dela ser mulher pouca importância tem à trama (até porque não passa de um Capitão América de saias) e nem mesmo a sociedade das amazonas é explorada a contento (deviam ser todas lésbicas já que não existiam homens por lá, não?).

Resumindo, é mais do mesmo e o melhor é simplesmente não passar nem perto de mais essa besteira, principalmente as crianças que deveriam ser o público alvo do gênero.

Cotação: *1/2

sábado, 3 de junho de 2017

Filmes: "Machuca"

TRÁGICO E DOLOROSO

Assista este filme para entender porque, afinal, ninguém tem coragem de se assumir como sendo de “direita” na América Latina...

- por André Lux, crítico-spam

Você já se perguntou por que ninguém tem coragem de admitir que seja de “direita” na América do Sul? Assista “Machuca” e vai saber a resposta. Este filme chileno do diretor Andrés Wood se passa durante os últimos meses do governo socialista de Salvador Allende, quando o padre que dirige uma escola para crianças da classe média alta implanta uma política do governo que reserva vagas para alunos oriundos das classes pobres.

Um desses meninos é justamente o Machuca do título, que acaba ficando amigo de Gonzalo, um filho das “elites” e provável alter-ego do próprio cineasta (o filme termina com uma frase em homenagem a um padre real, que obviamente deve ter semelhanças com o personagem de "Machuca").

A amizade dos dois representa o abismo que existe entre as classes sociais, o qual fica escancarado quando um vai visitar a casa do outro. Gonzalo, que mora numa bela residência, tem um pai boa praça, porém ausente e alienado, enquanto sua mãe é a personificação da “dondoca” suburbana fútil e louca por dinheiro (ao ponto de ser amante de um político rico do qual recebe vários “presentes” chiques). A irmã do menino namora uma boçal violento e agressivo que faz parte do “Comando de Caça a Comunistas” chileno.

Já Machuca mora numa favela com a mãe, a irmã e um tio. Seu pai é um bêbado que aparece só para arrancar dinheiro da mãe e dar porrada nos filhos. Só por curiosidade, li um profissional da opinião dizendo que o filme “falha” ao mostrar a pobreza de forma idílica! Concordo com ele, afinal quem é que não sonha em morar num barraco feito de tábuas e lonas enquanto recebe uns sopapos do pai bêbado e cafetão dia sim, dia não?

Enfim, dessa improvável amizade acompanhamos os dois meninos passando por várias situações que servem para reforçar o caos político promovido pelos golpistas que se abatia sobre o país. O tio de Machuca ganha a vida vendendo bandeiras dos partidos de direita e de esquerda nas várias passeatas contra e a favor do governo. E leva os garotos juntos, que ignorantes do que se passava, saiam alegremente repetindo os jargões dos manifestantes, seja de qual tendência eram representantes.

Mas as coisas começam a mudar para Gonzalo quando encontra o namorado truculento da irmã e a própria mãe numa das passeatas, durante a qual a irmã de Machuca é humilhada e agredida por fazer parte da “ralé”. Em outra cena emblemática e muito triste, os pais da high society protestam numa reunião do colégio contra a presença das crianças pobres que, nas palavras deles, não devem se misturar com seus filhos. Uma das mães pobres faz então um tocante discurso sobre a trágica história de toda sua família, só para ser acusada por uma dondoca de “ressentida, rancorosa, volte para o lugar de onde veio!”.

Não quero revelar mais da trama, mas basta dizer que o filme segue o ritmo dos golpistas até a sangrenta derrubada do governo socialista pelos milicos do general Pinochet, que lançaram sobre o Chile a mais brutal e selvagem ditadura da América Latina. Ditadura que foi notável também por ter sido o primeiro regime a implantar - sobre o cadáver de milhares de cidadãos que ousaram lutar por um mundo mais justo e menos desigual - a nefasta ideologia neoliberal, que hoje colocou o mundo de joelhos.

Nem preciso dizer que o final de “Machuca” será terrivelmente trágico e doloroso. E basta assisti-lo para entender porque, afinal, ninguém tem coragem de se assumir como sendo de “direita” por essas bandas...

Cotação: * * * *

Filmes: "Brazil - O Filme"

.
FUTURO DO PRETÉRITO

Alegoria ácida sobre a perda da humanidade numa sociedade totalitária e consumista, mistura "1984" e "O Processo" com toques do Monty Python. 

- Por André Lux, crítico-spam

Lá pelo final de 1985, os executivos da Universal Pictures, preocupados com o possível fracasso de um filme que produziram e estavam para distribuir nos EUA, marcaram uma reunião urgente com o seu realizador durante a qual pediram pouca coisa: que ele reduzisse a metragem, trocasse a trilha sonora orquestral por outra com canções pop e, especialmente, mudasse a conclusão amarga para um típico happy end hollywoodiano, do tipo "o amor vence tudo". 

Essas mudanças iriam, na opinião deles, tornar o filme muito mais comercial, garantindo seu sucesso. O cineasta explicou então, na sua característica maneira pouco ponderada, que o filme deveria ficar do jeito que havia sido idealizado, caso contrário ele iria botar fogo nos negativos!

A cena narrada acima pode parecer o delírio de algum comediante, mas ela aconteceu de verdade - infelizmente. O filme em questão chama-se "Brazil", e o diretor, Terry Gilliam. 

Insatisfeitos com o resultado final do terceiro longa-metragem do ex-integrante do grupo Monty Python, o qual consideraram pesado e amargo demais para os padrões aceitos pelo público dos EUA, os executivos da Universal decidiram que "Brazil" deveria ser reeditado e transformado em um filme mais "aventuresco" e "leve". 

Dos originais 142 minutos de projeção, que foram lançados pela Fox sem problemas na Europa e em outras partes do mundo (como o Brasil), Gilliam concordou em reduzir o filme em cerca de 20 minutos. Mas não foi o suficiente.

A Universal era liderada na época pelo infame Sid Sheinberg que, entre outros absurdos, foi o responsável direto pela destruição de "A Lenda", de Ridley Scott (que deixou o estúdio retalhar e mudar a trilha musical de seu filme) e pela aprovação do lamentável "Howard, O Pato", de George Lucas. Sheinberg, a exemplo do que acontece ao protagonista do próprio filme de Gilliam, tornou-se o "torturador particular" do cineasta, cercando-o de todas as formas possíveis (inclusive legais) para poder retirar o projeto das mãos dele a fim de torná-lo "mais comercial".

Versões e (in)Versões
Essa feroz batalha entre o artista e os engravatados da Universal (em mais uma reedição do clássico embate entre David e Golias) é uma das mais famosas e ilustrativas acerca de como funciona o sistema de produção em série da indústria cultural estadunidense. 

E ela está descrita, com riqueza de detalhes, ilustrações e depoimentos de todos os envolvidos, no excelente livro "The Battle of Brazil", de Jack Mathews, jornalista de Los Angeles que cobria a produção do filme na época. Mathews transformou seu livro em um documentário de uma hora de duração, que pode ser assistido no box de "Brazil", lançado pela The Criterion Collection na região 1, que traz nada menos do que três discos.

No primeiro disco, temos a versão de Terry Gilliam para o filme, com seus gloriosos 142 minutos de projeção, remasterizado digitalmente no formato widescreen 1.85:1, trazendo ainda uma faixa de áudio com comentários do diretor. No segundo, chamado de "The Production Notebook", encontramos vários making of, entrevistas com os roteiristas Tom Stoppard e Charles McKeown, com o compositor Michael Kamen (que utiliza na trilha de forma magistral trechos de "Aquarela do Brasil", de Ary Barroso), storyboards, cenas raras da produção dos efeitos especiais, além é claro do excepcional documentário "The Battle of Brazil".

O material mais curioso, todavia, está contido no terceiro disco: nada mais do que a infame versão "Love Conquers All" ('O Amor Vence Tudo) de "Brazil", montada à revelia do diretor, trazendo meros 94 minutos de projeção e um ridículo happy end, que simplesmente detonam a obra em questão deixando-a totalmente sem sentido. 

Pior que essa grotesca (in)versão foi exibida nas televisões dos EUA, por anos a fio. Existe ainda um canal de áudio onde David Morgan, expert em Terry Gilliam, faz uma análise extremamente crítica de todas as alterações feitas.

Orwell encontra Kafka no circo do Monty Python
Quanto ao filme, trata-se de uma alegoria extremamente ácida e anárquica sobre a perda da humanidade frente a uma sociedade totalitária e cada vez mais repleta de burocracia e obcecada pelo consumismo. Trata-se de uma mistura de "1984", de George Orwell, com ''O Processo'', de Kafka, com toques do humor bizarro e non-sense próprios do sexteto inglês do qual Gilliam fazia parte, o Monty Python.

Além disso, o filme é premonitório do futuro catastrófico imposto ao mundo caso a doutrina neoliberal, que na época ainda estava em processo de implantação, fosse levada às últimas conseqüências. 

Reparem como o Estado retratado no filme é o sonho de qualquer defensor do neoliberalismo: enxuto, isento de qualquer responsabilidade social e praticamente restrito ao aparato policial de vigilância e repressão constante às classes mais baixas, mantido graças a um clima de medo e paranóia constante propagado pela mídia e por supostos ataques de "terroristas".

O protagonista dessa epopéia, interpretado brilhantemente por Jonathan Price, é Sam Lowry, um funcionário público apático e conformista, que passa acidentalmente a lutar contra o sistema depois que descobre que a mulher de seus sonhos existe e está marcada para morrer. 

É a típica trama do anti-herói forçado a agir, mesmo contra sua vontade, para conquistar seus desejos. Na sua aventura, ele conta ainda com a ajuda do engenheiro-de-calefação-autônomo e dublê-de-terrorista, Harry Tuttle (na pele de um Robert De Niro praticamente irreconhecível).

Só que catarse e redenção são palavras que não fazem parte do dicionário de Terry Gilliam, como Lowry vai descobrir dolorosamente no final. E a melhor explicação para essa filosofia de vida vem do próprio diretor: "Nós não damos respostas, apenas apontamos para o óbvio que ninguém quer ver, de um modo engraçado. E quando as pessoas pegam-se rindo daquilo, esperamos que elas pensem: 'Ei, eu não deveria estar rindo, isso é horrível!'".

Sobre o motivo do filme se chamar "Brazil", Gilliam explica: "Port Talbot é uma cidade de ferro, onde tudo é coberto por um pó cinza de metal. Até a praia é completamente coberta de pó preto. O sol estava se pondo e era realmente bonito. O contraste era extraordinário. Eu tinha essa imagem de um cara sentado nessa praia moribunda com um rádio portátil, sintonizando estranhas canções escapistas latinas como [Aquarela do] Brasil. A música o transportou de alguma forma e fez o seu mundo menos cinza".

Quanto ao desfecho da "Batalha por Brazil", o vencedor foi, em última instância, o nosso "David" da sétima arte, que passou a usar táticas de guerrilha para promover o lançamento de seu filme intacto, tais como patrocinar exibições piratas para estudantes e críticos de cinema, bem como tornar público o martírio pelo qual estava sendo obrigado a passar pela Universal - Gilliam chegou a pagar um anúncio de página inteira no jornal Variety com a seguinte mensagem: "Querido Sid Sheinberg. Quando você vai lançar meu filme 'Brazil'?". Em um outro momento, Gilliam mostrou uma foto do executivo em um programa de entrevistas do qual participava, e soltou no ar, ao vivo: "Esse é o homem responsável pela minha dor".

Mas tamanha audácia provou-se válida, tanto que o filme ganhou os principais prêmios da Associação de Críticos de Cinema de Los Angeles (melhor Filme, Diretor e Roteiro) e acabou sendo lançado intacto (mas modestamente) nos cinemas dos EUA, dividindo público e crítica, fato que não incomodou em nada o cineasta. "Para algumas pessoas, meu filme foi o equivalente a um espancamento", diz Gilliam rindo. "Para outras, foi uma experiência maravilhosa. Perfeito. Eu não fiz o filme pensando em agradar alguém...". 

É certo que, depois desse evento notório e constrangedor, as políticas dos grandes estúdios, relativas a quem seria responsável pelo corte final dos filmes, nunca mais foram as mesmas.

Infelizmente, essa caixa com os três discos dificilmente será lançada no Brasil. Portanto, você precisará ter um bom dinheiro sobrando para colocar suas mãos nela. Mas, se tiver, certamente não vai se arrepender!

Por aqui, o filme foi lançada pela Fox (que detém os direitos de distribuição fora dos EUA) na versão normal sem cortes, mas desprovida de qualquer extra ou comentário (veja reprodução da capa à direita).

Cotaçâo: * * * * *
.

domingo, 21 de maio de 2017

Filmes: "Rei Arthur - A Lenda da Espada"

INSUPORTÁVEL

Tudo é tão mal feito, escuro e histérico que fica impossível até entender o que se passa na tela

- por André Lux, crítico-spam

Fazia tempo que não via um filme tão insuportável quanto esse “Rei Arthur - A Lenda da Espada”. Não bastasse ser mais uma adaptação da batida lenda dos cavaleiros da Távola Redonda, é todo picotado e frenético na edição, ao ponto se tornar inteligível em várias sequências. Acaba parecendo mais uma mera colagem das cut scenes de videogames, aquelas cenas que interligam uma fase do jogo à outra onde você não pode interagir.

Claro que a culpa maior disso é do diretor Guy Ritchie que chamou a atenção em 1998 com o interessante “Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes”, mas depois apenas se repetiu ou lançou porcarias indefensáveis como os dois “Sherlock Holmes”, com Robert Downey Jr. Se o estilo frenético do cineasta já não combinava com as aventuras do detetive da era vitoriana, fica ainda mais ridículo aqui, onde a ação se passa numa época medieval mítica.

“Rei Arthur - A Lenda da Espada” tenta ser uma mistura de “Senhor dos Anéis”, “Game of Thrones” (tem até dois atores da série, um deles o “Littlefinger”), “Vikings”, “Harry Potter”, “Star Wars” (Eu sou seu tio!) e um monte de outros filmes que estão na moda atualmente (tem até um mestre de Kung-Fu!), tudo embalado como se fosse uma aventura moderna e descolada iguais aos filmes iniciais do Guy Ritchie, inclusive com os personagens falando e vestindo-se como se tivessem acabado de sair de um pub na periferia de Londres.

Mas tudo é tão mal feito, escuro e histérico que fica impossível até entender o que se passa na tela, como na sequência onde Arthur tem que ir à ilha sombria passar por provações e testes, mas isso é visto numa mistura de flashbacks e fast-fowards sob uma narração que vai explicando mal e porcamente o que está acontecendo. Não bastasse isso, o roteiro é péssimo e muda vários pontos da lenda clássica, colocando Arthur como filho do rei Uther que é lançado no rio e vira um lutador de rua criado por prostitutas, o que nos obriga a ver várias cenas dele esmurrando pessoas, repetindo a mesma besteira que Ritchie fez com Sherlock Holmes.

O filme já começa de forma risível, com uma batalha onde elefantes gigantescos (10 vezes maiores que os do “Senhor dos Anéis”) atacam Camelot sob o comando do mago Mordred, que além disso ainda joga bolas de fogo que desintegram os soldados inimigos. Mas bastou Uther Pendragon dar uma de Legolas, subir no elefante do chefe e, pronto, usando a poderosa espada Excalibur corta a cabeça do mago do mal. Por sinal, a famosa espada aqui funciona quase como o martelo do Thor e a gente nunca fica sabendo a extensão de seus poderes.

Aí descobrimos que tudo isso não passou de um plano engendrado pelo irmão do rei (Jude Law, que tem cara de almofadinha e não convence como vilão, perdendo-se em uma atuação digna dos piores canastrões) que se uniu ao Mordred para tomar o poder. Mas, como não dá certo, ele vai ao porão do castelo (hein?) e chama a vilã Úrsula de “A Pequena Sereia” que, depois de um sacrifício, o transforma numa mistura de Balrog com Sauron e, pronto, ele derrota o irmão e toma o trono. O que nos faz perguntar: se tinha esse poder todo à disposição, por que não o usou logo de cara?

O protagonista é feito por um loiro aguado (Charlie Hunnam de “Círculo de Fogo”) que tem a expressão de uma escultura de pedra e o carisma de uma ostra em coma. Para atrapalhar mais ainda, seu personagem não tem qualquer desenvolvimento e age de forma estúpida e petulante o tempo todo. Nem mesmo a cena em que tira a espada da pedra tem qualquer impacto, de tão forçada e mal encenada. Também não faz o menor sentido ele ter problemas em aceitar a Excalibur, muito menos as ações da maga que o ajuda. No final ela conjura uma cobra gigante que simplesmente aparece do nada e mata quase todos os malvados, o que nos faz perguntar novamente: por que não usou tal poder antes?

A trilha musical de Daniel Pemberton é ensurdecedora e completamente incongruente com o que vemos na tela, parecendo mais rejeitos de alguma banda de trash metal. A fotografia é escura e esmaecida, os efeitos visuais parecem pior do que muitos videogames e a única coisa que se salva às vezes é o desenho de produção.

Se você quiser conhecer a lenda do Rei Arthur, melhor mesmo ver “Excalibur”, do John Boorman (1981), ou então a sátira demolidora “Em Busca do Cálice Sagrado”, do Monty Phyton. Fuja desse “Rei Arthur” metido a besta!

Cotação: *

sexta-feira, 12 de maio de 2017

"Alien", de Jerry Goldsmith: uma análise

Cine-Trash: "Alien: Covenant"

VAI ********!

Faltam-me adjetivos depreciativos para classificar esse novo candidato a obra-prima do cinema trash!

- por André Lux, crítico-spam

O diretor Ridley Scott conseguiu fazer algo impensável: uma continuação de “Prometheus” ainda pior que o anterior. Apesar de levar o título “Alien”, praticamente nada tem a ver com a série original e mesmo o monstro clássico aparece só no final e de maneira ridícula. Porra, tem uma cena que o alien sai de dentro do peito de um sujeito já parecido com  a sua forma final, fica em pé e abre os bracinhos, conseguindo ser mais ridículo que a paródia feita por Mel Brooks em "Spaceballs"! Vai ********
! 

Perto desse lixo, “Prometheus” nem parece tão ruim, ao menos tinha algum clima e pretensão de contar uma história minimamente interessante, mesmo que falhando fragorosamente. Bom, comparado a isso até os "Alien Vs. Predador" parecem filmes classe A!

O roteiro desse “Alien: Covenant” basicamente pega tudo de interessante em “Prometheus”, joga na privada e enfatiza o que havia de pior. Toda aquela história sobre os Engenheiros que teriam criado a vida na Terra é resolvida da maneira mais infame possível e abandonada sem a menor explicação. O que sobra então é um amontoado de cenas desconexas umas das outras, com os personagens agindo sempre da forma mais estúpida e inverossímil possível. 


Os astronautas, por exemplo, chegam no novo planeta para explorar e, claro, resolvem descer nele na mesma hora bem no meio de um gigantesco furacão! Obviamente, quase morrem na descida e ficam sem contato com a nave mãe, mas assim que pousam já saem andando numa boa, sem qualquer proteção (que tal um traje hermético?), metendo a mão e pisando em tudo que enxergam, inclusive uns casulos estranhos que, adivinha, soltam esporos que contaminam alguns e fazem brotar de dentro deles em questão de minutos uns aliens brancos risíveis! Por sinal, esses esporos e os monstros que saem deles acabam sendo muito mais terríveis que os próprios Aliens!

A única relação com “Prometheus” se dá com um subtexto religioso idiota que não leva a lugar algum e com a aparição do androide David (o coitado do Michael Fassbender, completamente perdido e que ainda tem que dobrar fazendo o outro androide Walter). Ele está há uns 10 anos lá e virou um psicopata completo com delírios de grandeza que cultiva e tenta aperfeiçoar os xenomorfos para acabar com a raça humana... Como é que é? Essa bobagem contamina os filmes originais, pois de um predador perfeito o Alien se transforma num experimento genético criado por um androide defeituoso? Tenha dó!


Enfim, é tanta estupidez junta que fica até difícil de resumir e, sinceramente, pode até dar a impressão que o filme é algo mais do que uma refilmagem de “Sexta-Feira 13” com uns aliens digitais toscos no lugar do Jason, matando adolescente no chuveiro (não estou brincando, tem uma cena assim mesmo!).

O elenco do filme é simplesmente pavoroso. Conseguiram até enfiar o insuportável James Franco no meio dessa josta, mas felizmente ele vira torrada antes mesmo de sair do casulo de hibernação e só aparece brevemente num vídeo pré-gravado! Ridley Scott, que já foi um dos maiores cineastas do mundo, deve ter dirigido “Alien: Covenant” sob o efeito de soníferos ou alcoolizado, pois nem mesmo esteticamente bonito o filme é. Na parte final, principalmente, impressiona a ruindade da cinematografia e da edição que chegam a níveis amadorísticos. A conclusão então não tem pé nem cabeça e é do tipo que vai fazer você se contorcer em agonia frente a tanta estupidez!

A trilha musical de um tal de Jed Kurzel é fraca e fica mais lamentável quando tenta incorporar os temas originais criados pelo mestre Jerry Goldsmith para o primeiro “Alien” - o que serve apenas para nos lembrar do quanto era genial aquele filme produzido lá atrás em 1979 e que parece mil vezes mais bem feito e moderno do que esse lixo feito em 2017, com o triplo de dinheiro e recursos.

Faltam-me adjetivos depreciativos e pontos de exclamação para classificar esse novo candidato a obra-prima do cinema trash – e olha que fui ao cinema com a expectativa bem baixa! É lamentável para qualquer fã da série original ver o sensacional Alien ser transformado em um mero caça-níqueis para que o decadente Ridley Scott possa pagar suas contas atrasadas. Tomara que seja um fracasso nas bilheterias para que ele volte sua atenção para outras bandas. Ninguém merece!

Cotação: *

quarta-feira, 10 de maio de 2017

quinta-feira, 4 de maio de 2017

Filmes: "Guardiões da Galáxia - Vol. 2"

MELHOR QUE O PRIMEIRO

Tom de comédia assumido deixa o filme mais leve e esconde furos e besteiras

- por André Lux, crítico-spam


Esse novo “Guardiões da Galáxia – Vol. 2” é melhor que o primeiro, mas ainda tem alguns problemas básicos. Primeiro, batalhas espaciais exageradas demais, como a do começo onde os heróis são atacados por um enxame de milhares de naves, o que torno tudo confuso e difícil de seguir. 

A trama, igual a quase todos os filmes da Marvel, novamente gira em torno de um super-ser buscando algo poderoso para poder se tornar ainda mais poderoso, embora aqui só revelem quase no final e aí o filme desande um pouco para aquelas lutas exageradas.

Mas ao menos o humor é mais explícito, as piadas mais inteligentes (conseguiu me fazer rir muito na cena do salto entre os portais) e o filme é bem menos violento que o anterior. O elenco está mais à vontade e a química entre eles funciona. Kurt Russel surge como o pai do herói e é sempre um ator carismático. Até o Stallone dá as caras, mas não tem nada a fazer no que é basicamente uma ponta para introduzir um personagem que vai aparecer em outros filmes derivados desse.

Forçam a barra para transformar o personagem Yondu (feito pelo competente Michael Rooker) em algo muito maior do que um reles mercenário que usava e abusava do protagonista, mas sinceramente achei piegas e não convincente, especialmente quando tem a cena final apoteótica.

Gostei do desenho de produção e das lutas bem coreografadas. No começo o diretor tenta mudar o foco, prendendo a câmera no bebê Groot enquanto os heróis enfrentam um monstro enorme e a gente só consegue ver eles brigando no canto da tela enquanto o ser de madeira dança ao som de uma das músicas pop que recheiam a trilha. Nos créditos finais aparecem nada menos que cinco cenas (mas quase nada acrescentam), no que já virou marca registrada da Marvel.

Não é grande coisa, mas o tom de comédia assumido deixa o filme mais leve e esconde os furos e besteiras. Dá pra assistir sem se aborrecer.

Cotação: * * *

quarta-feira, 26 de abril de 2017

Trilhas sonoras: minha lista das preferidas


Acho que seria pretensão da minha parte fazer uma lista as melhores trilhas de todos os tempos, portanto a lista abaixo é das minhas trilhas preferidas, não necessariamente na ordem de preferência. Com certeza deixei muita coisa boa de fora, mas fazer listas é assim mesmo... E as de vocês, quais são?

1) O IMPÉRIO CONTRA-ATACA (John Williams) 

O segundo capítulo da saga original de "Guerra nas Estrelas" tem uma trilha simplesmente primorosa.

Além de possuir dezenas de temas e pequenos “motifs” para cada personagem (até para os robôs R2-D2 e C3PO!), que são as marcas registradas de Williams, conta com uma complexidade orquestral incrível, principalmente nas músicas para as cenas de ação. 

Destaque para toda a música que acompanha a sequência da batalha na neve no planeta Hoth, de altíssima complexidade, e para a perseguição nos asteróides acompanhada por um scherzo de tirar o fôlego. 

Foi nesta partitura que John Williams criou o insuperável tema do Darth Vader (que não existia no primeiro capítulo da série original). E também o inspiradíssimo tema de Yoda, um dos mais graciosos do cinema.

2) JORNADA NAS ESTRELAS – O FILME (Jerry Goldsmith) 

Continua imbatível a trilha para o primeiro filme de Kirk e Spock para os cinemas. O tema principal é sensacional e a faixa “The Enterprise”, um balé maravilhoso que dura mais de cinco minutos e termina de forma arrepiante. 

Destaque para o uso do blaster beam, um recurso sonoro impressionante que serve de assinatura para o invasor alienígena V'Ger (Goldsmith era famoso pelos instrumentos inusitados e invetivos que usava em suas partituras). 

Recentemente consegui a trilha completa, em 3 CDs, que contém inclusive as faixas originais que o mestre Goldsmith compôs antes de criar o tema principal e foram rejeitas. Simplesmente supimpa! 

E pensar que passei anos da minha vida tendo que me contentar em ouvir essa magnífica trilha numa fita K-7 que depois de uns 10 anos simplesmente se desintegrou de tanto ser tocada...

3) ALIEN, O OITAVO PASSAGEIRO (Jerry Goldsmith) 

Sem dúvida, em se tratando de música de medo, “Alien” é o que há de melhor. A partitura é basicamente atonal, embora Goldsmith tenha composto um tema romântico para os astronautas que foi pouco usado na montagem final. 

O compositor tira sons de arrepiar da orquestra e usa instrumentos inusitados para marcar as aparições do monstro que são de gelar o sangue. 

O mais incrível é que quase todas as faixas compostas por Goldsmith para o filme acabaram sendo usadas em cenas diferentes das quais foram criadas e mesmo assim a trilha continua funcionando perfeitamente. 

Nem mesmo a inclusão de duas faixas da trilha que Goldsmith escreveu para “Freud” e uma composição de Howard Hanson para o final atrapalham. 

Há pouco tempo o selo Intrada lançou um álbum duplo como a trilha completa de “Alien”, com todos os temas originais e as novas composições criadas por Goldsmith para o filme. Imperdível.

4) KRULL (James Horner) 

Em minha modesta opinião, essa é a melhor trilha sonora composta por Horner. 

Usando um tema vibrante e muito bonito que permeia toda a trilha, o compositor dá vida a um filme que sem a sua música viraria piada. 

Mas Horner rege a Orquestra Sinfônica de Londres e segura as pontas, sem ter vergonha de ser grandiloquente ou romântico, no melhor estilo "capa e espada". 

Destaque para o Main Title e para a corrida com as éguas de fogo que saem voando pelos céus de Krull (sim, é isso mesmo, você leu direito!). 

O bacana dessa trilha é que ela não tem quase nada de material reciclado do próprio Horner, uma de suas características mais irritantes. Também é a mais original do compositor, uma verdadeira obra prima! 

E o mais legal é que um selo de colecionadores lançou a trilha completa num CD duplo excelente com 21 faixas, pois a versão oficial original tinha só meia dúzia delas.

5) Trilogia O SENHOR DOS ANÉIS (Howard Shore) 

Eu fui um dos poucos que ficaram felizes com a escolha de Howard Shore para compor a música da trilogia de "O Senhor dos Anéis". 

É que eu já era fã dele há mais tempo e conhecia seu trabalho mais a fundo. 

E ele não decepcionou, pelo contrário. Compôs uma das partituras mais incríveis da história do cinema numa empreitada heróica – os três filmes usam música em quase todas as cenas e esse tipo de opção quase nunca dá certo. 

Dos três filmes, minha preferida é a do primeiro, principalmente toda a sequência dentro das minas dos anões, mas as outras duas também são excelentes. Impressiona a riqueza dos temas e da textura sonora que Shore criou para as cenas de batalha. 

Para se ter ideia da riqueza e complexidade do seu trabalho, ele teve que compor o tema de Gondor já para o primeiro filme, sendo que ele só iria ser usado em toda sua grandeza no último filme, "O Retorno do Rei", quase quatro anos depois! 

Procure as edições completas das trilhas, cujas edições são simplesmente primorosas.

6) CINEMA PARADISO (Ennio Morricone) 

Lembro até hoje quando comprei o CD com a trilha desse filme numa lojinha no centro de São Paulo. Foi a primeira vez na minha vida que chorei ouvindo música! 

Morricone é um mestre e compôs mais de 400 trilhas, por isso é muito difícil escolher uma trilha preferida dele, mas a tendência é preferir aquelas que mais me emocionam quando lembro do filme. 

E "Cinema Paradiso" é a principal delas. A trilha tem um tema central simples, porém muito sensível que passa com perfeição a sensação de nostalgia e amargura que pontua o filme todo. Outro destaque é o pequeno tema cômico que acompanha as aventuras de Totó e Alfredo.

O tema de amor foi composto pelo filho do Compositor, Andrea Morricone, e é belíssimo. 

Vale a pena procurar a versão completa da trilha, lançada na europa.

7) EM ALGUM LUGAR DO PASSADO (John Barry) 

Essa deve ser a trilha sonora mais romântica do cinema. 

E nisso John Barry é mestre, embora no começo de sua carreira fosse mais lembrado como compositor das músicas de ação para os filmes do James Bond. 

A trilha de "Em Algum Lugar no Passado" carrega o filme nas costas e é outra que tem lugar garantido entre as preferidas pelos apreciadores do gênero. 

Basicamente a partitura gira em torno do tema principal, que é apresentado em diversas versões e leituras através do filme, mas mesmo assim nunca cansa e continua emocionando até hoje. 

Existe uma regravação, conduzida por John Debney, que traz a partitura completa do filme e não fica nada a dever da original.

8) BLADE RUNNER (Vangelis) 

Ridely Scott só chamou o compositor grego no final do segundo tempo para compor a trilha dessa clássico da ficção científica. 

E Vangelis humilhou, criando uma trilha atemporal que vai contra toda a tradição do gênero. 

Existencialista, suave e angustiante, a música de “Blade Runner” continua impressionando pela sua inventividade e beleza até hoje. 

Infelizmente, devido a problemas contratuais, a trilha nunca foi lançada oficialmente na versão completa e demorou anos para sair numa versão oficial (a primeira era apenas uma releitura feita pela The New American Orchestra!). 

Recentemente, saiu um CD triplo supostamente com a partitura completa, porém muitas músicas continuaram de fora e o terceiro CD é só com músicas novas do Vangelis inspiradas no filme, o que irritou muito os apreciadores. Existem várias versões piratas que tentam preencher esse lamentável vácuo.

9) UM CORPO QUE CAI (Bernard Herrmann) 

A parceria entre o genial Bernard Herrmann e o diretor Alfred Hitchcock produziu trilhas magníficas e inesquecíveis para o cinema, sendo "Psicose" talvez a mais lembrada e admirada. 

Mas para mim a que mais marcou foi a de “Um Corpo Que Cai”. 

A partitura de Herrmann é um caleidoscópio de temas e sonoridades complexas que vai se desenvolvendo gradualmente, ajudando o desenrolar do suspense da trama do filme até o final surpreendente. 

Um verdadeiro clássico do gênero! 

Existem várias versões da trilha, inclusive uma regravação da partitura completa conduzida por Joel McNeely que é muito boa e não fica nada a dever para o original.

10) A MISSÃO (Ennio Morricone) 

Essa é a trilha que me fez virar fã de carteirinha do mestre Ennio Morricone quando eu era apenas adolescente e ainda causa impacto até hoje, mesmo tendo gerado um sem número de imitações. 

"A Missão" também foi o primeiro filme sério que eu assisti nos cinemas e gostei de verdade, abrindo meus olhos para outros tipo de gênero além de terror, aventura e ficção científica. 

O uso de coral na trilha é maravilhoso e emociona até quem não é chegado em religião ou mesmo ateu como eu (o filme é sobre padres jesuítas que lutam para salvar os índios na América do Sul da época da invasão européia, com resultados trágicos). 

Não ter ganho o Oscar de melhor trilha sonora em 1987 foi uma vergonha, mas abriu as portas para o compositor italiano que depois escreveu a partitura para dezenas de filmes em Hollywood.

11) CONAN, O BÁRBARO (Basil Poledouris) 

Outra trilha que faz extensivo uso de corais em diversas faixas. 

É uma verdadeira sinfonia, já que o filme tem pouquíssimos diálogos e é conduzido pela música magistral de Basil Poledouris em quase todas as cenas. 

O filme tem seus detratores, por causa da violência excessiva, mas a trilha é sempre lembrada com carinho pelos colecionadores. 

Destaque para o tema principal (“Anvil of Crom”) e para a música da batalha final, entre as mais poderosas do cinema, ideal para ouvir quando se está malhando na academia de ginástica! 

O selo Varese Sarabande, especializado em música de cinema, lançou a trilha numa versão quase completa e existem versões piratas por aí que clamam trazer a versão completa da obra. 

Mas só recentemente o selo Intrada lançou um CD triplo com a trilha completa do filme, mais versões alternativas e a edição do album original com os destaques e diferenças na mixagem.

12) OS CAÇADORES DA ARCA PERDIDA (John Williams) 

Depois de “Guerra nas Estrelas” e "Superman", Williams comprova novamente sua maestria em criar temas nesse primeiro filme da série do Indiana Jones, também a trilha mais complexa e memorável dos quatro. 

Quem não conhece o tema do protagonista, um dos mais "assobiáveis" do cinema? 

O grande destaque da trilha fica sem dúvida com “The Desert Chase”, música para a perseguição do caminhão no deserto que tem quase oito minutos de poder puro, daqueles de deixar a gente sem fôlego! 

A trilha do segundo filme é quase tão boa quanto a do primeiro, inclusive usando muito coral de vozes e percussão pesada nas cenas mais arrepiantes.

Foi lançado há alguns tempo um box com a trilha dos quatro filmes da série que traz a partitura (quase) completa dos três primeiros.

13) A LENDA (Jerry Goldsmith) 

Essa é considerada uma das mais belas e complexas trilhas do mestre Goldsmith.

Mas, por incrível que pareça, foi rejeitada pelo presidente do estúdio (o mesmo idiota que tentou fazer Terry Gilliam deixar "Brazil" com final feliz!) que exigiu do diretor Ridley Scott uma música mais “pop” para seu conta de fadas! 

E o mais triste é que ele aceitou, usando música nova (e fraquinha) do grupo de rock progressivo Tangerine Dream, para irritação máxima de Goldsmith, que nunca mais quis nem saber do diretor Scott. 

Felizmente, nas cópias européias do filme (que chegaram a ser exibidas no Brasil na época) a trilha de Goldsmith permaneceu intacta e é o principal motivo do filme continuar a ser lembrado até hoje. 

Repleta de temas primorosos, a partitura faz uso extensivo de corais e de orquestrações complexas, além de sons eletrônicos criativos, típicos do mestre. 

Para alegria dos apreciadores, a trilha quase completa, conforme havia sido gravada para o filme, foi lançada em CD. 

Anos depois o próprio Ridley Scott reconheceu seu erro e relançou o filme em DVD na versão completa, com a música maravilhosa e emocionante de Goldsmith intocada.

14) YOUNG SHERLOCK HOLMES (Bruce Broughton) 

Chamado no Brasil de “O Enigma da Pirâmide”, esse filme sobre uma suposta juventude do detetive Sherlock Holmes contou com uma trilha sonora primorosa composta por Bruce Broughton, um dos compositores mais prolíficos dos anos 80. 

Perfeitamente adequada para o clima leve do filme, impressiona também quando precisa ser mais dramática ou pesada. 

A faixa com coral (“Waxing Elizabeth”) é lembrada com carinho pelos fãs e o tema principal é uma delícia! 

Lamentavelmente, a versão completa da trilha foi lançada pela Intrada em versão promocional às custas do próprio compositor e hoje é quase impossível de ser achada, embora existam outras versões piratas, inclusive com as sessões de gravação completas da trilha!

Somente em 2014, a trilha completa foi lançada oficialmente em um album duplo, novamente pela Intrada. Sensacional!

15) FORÇA SINISTRA (Henry Mancini) 

O famoso compositor dos filmes da "Pantera Cor de Rosa" e mais lembrado por suas músicas para comédias e romances, compôs uma trilha espetacular para esse filme de terror quase trash sobre vampiros espaciais que são trazidos para a Terra do cometa Halley. 

A trilha já começa em alta, com um vigoroso tema principal e não para nunca, principalmente no final apocalíptico do filme, onde Mancini pega você pela garganta e faz maravilhas mesmo tendo como inspiração algumas cenas bem ridículas (mas cheias de efeitos especiais espetaculares). 

A música dele é tão boa que, no final das contas, os realizadores imbecis acharam melhor chamar outro músico, no caso Michael Kamen, para compor umas faixas eletrônicas horríveis para usar no lugar da poderosa música orquestral de Mancini! 

Ainda bem que na versão lançada em DVD a trilha original está restaurada. O duro é ver o filme sem rir. 

Melhor mesmo é comprar o CD duplo lançado há pouco tempo, que inclusive traz a horrível música composta por Kamen.

16) A GUERRA DO FOGO (Philippe Sarde)

Essa é uma trilha sonora realmente "cavernosa"! 

Composta por Philippe Sarde para o filme sem diálogos (ao menos inteligíveis) de Jean Jacques Annaud (de "O Nome da Rosa") sobre a luta de um grupo de homens das cavernas para descobrir os mistérios do fogo.

A partitura estritamente orquestral alterna momentos atonais de pancadaria e poder puros, com direito a muitos solos de percussão, com outros mais intimistas relacionados à descoberta do amor pelos protagonistas. 

A melhor faixa é justamente o "Love Theme", uma belíssima suíte de cinco minutos que foi usada para encerrar o filme. 

Existe uma versão em CD com 14 faixas e outra editada na Europa mais nova com 17.

17) ERA UMA VEZ NA AMÉRICA (Ennio Morricone) 

Para a obra prima do diretor Sergio Leone, Ennio Morricone compôs uma de suas trilhas mais inspiradas, com momentos que fazem arrepiar até o último fio de cabelo, principalmente quando entram os solos vocais de Edda Dell'Orso. 

O tema de Deborah é simplesmente sublime, assim como o "Cockey's Song", que conta com solos da flauta Pan de Gheorge Zamfir (que no CD estão com mixagem e performance diferentes do que foi usado no filme). 

Morricone também incorpora trechos da canção Amapola em vários momentos da partitura de maneira tocante. 

É triste saber que a trilha de "Era Uma Vez Na América" não foi indicada ao Oscar simplesmente porque o estúdio responsável esqueceu de inclui-la na lista de inscrições! 

Existem duas versões em CD, uma com 15 e outra com 19 faixas.

18) ADEUS AO REI (Basil Poledouris)

É incrível a capacidade que alguns compositores tem de compor trilhas sensacionais para filmes ruins. 

É o caso de "Adeus ao Rei" que Poledouris compôs para esse filme do mesmo diretor de "Conan, o Bárbaro", John Millius, e estrelado pelo Nick Nolte (que passa o filme todo com um penteado lamentável, no estilo "juba de leão"). 

A partitura alterna momentos de rara beleza e sensibilidade musical com outros mais vigorosos e tem um tema principal majestoso. 

A impressão que dá é que o compositor conseguiu entender o espírito do filme melhor do que o diretor, pois muitas vezes a música acaba passando bem mais emoção do que a cena para a qual foi escrita. 

Os destaques ficam por conta do "Main Title" e das faixas "Battle Montage", "Nigel's Trip" e "This Day Forth". O selo Prometheus lançou o score completo, com 31 faixas, inclusive algumas alternativas e com mixagem diferente.

19) SUPERMAN - O FILME (John Williams) 

O tema criado por Williams para o personagem é tão perfeito que parece que já existia mesmo antes de ser composto. 

A música chega literalmente a "cantar" SU-PER-MAN nos créditos iniciais, que estão entre os mais bacanas da história do cinema! 

Mas a trilha de "Superman" não é só o tema principal, pois Williams criou toda uma gama de outros temas memoráveis que estão no mesmo nível do que fez de melhor em sua carreira: o tema do planeta Kripton, com seus corais de vozes fantasmagóricas, o tema de amor para Superman e a Lois Lane, que atinge seu auge na faixa "Can You Read My Mind?", e o tema dos vilões, que consegue ser cômico e passar uma sensação de perigo ao mesmo tempo. 

Existem duas versões em CD que valem a pena ser adquiridas: um album duplo que traz 35 faixas e outra saiu num box com 8 CDS que trazem todas as trilhas para os quatro filmes do homen de aço, com um total de 37 faixas para o primeiro filme.

20) GREYSTOKE - A LENDA DE TARZAN (John Scott) 

John Scott é um dos melhores compositores de música para o cinema. Infelizmente é um dos mais subestimados também. 

A maioria das trilhas que escreveu foi para filmes B ou mesmo irremediáveis trashs, como "Yor, o Caçador do Futuro" ou "King Kong 2". 

Mas, independente da qualidade do filme, sua música sempre manteve a qualidade. E quando foi chamado para musicar obras classe A, não decepcionou. 

É o caso de "Greystoke - A Lenda de Tarzan", do diretor Hugh Hudson, uma releitura hiper realista da famosa história do homem macaco. O tema principal composto por Scott é simplesmente um dos mais sublimes que já escutei em minha vida. 

A partitura também é recheada de passagens pesadas e atonais para ilustrar a vida selvagem na selva. 

Inacreditavelmente, essa trilha demorou décadas para ser lançada oficialmente em CD e existia apenas em versões piratas!

21) FUGA DE NOVA YORK (John Carpenter & Alan Howarth) 

John Carpenter é um dos meus diretores preferidos e seu "Fuga de Nova York" está entre os filmes que mais me marcaram na juventude. 

Além de dirigir e escrever roteiros, Carpenter também compôs a trilha musical de quase todos os seus filmes, mesmo não sendo músico! E por incrível que pareça, muitas de suas partituras são realmente boas, perfeitamente adequadas aos filmes. 

Embora não tenha o mesmo nível de complexidade das trilhas citadas anteriormente, "Fuga de Nova York" figura entre as minhas favoritas porque traz o filme à cabeça instantaneamente e tem um tema principal super cool

Composta em parceria com o compositor Alan Howarth, é uma trilha inteiramente eletrônica e minimalista, que lembra algumas composições de Ennio Morricone (Carpenter é fã confesso do compositor, tanto é que trabalhou junto com ele em "O Enigma do Outro Mundo"), porém bastante criativa e interessante mesmo longe do filme. 

O CD original da Varese Sarabande tinha apenas 13 faixas, mas foi depois lançada na versão completa com 28 faixas pela Silva Screen.

22) BEN HUR (Miklós Rózsa) 

Para muitos, Miklós Rózsa é o maior compositor de trilhas da história do cinema. Jerry Goldsmith resolveu que seria compositor de músicas para filmes depois de assistir "Spellbound" de tão impressionado que ficou com a música composta por Rózsa. 

Entre suas obras mais famosas estão "Quo Vadis", "El Cid" e "Rei dos Reis". E, claro, "Ben Hur". 

Chamar essa trilha de épica é brincadeira. Trata-se de uma obra simplesmente colossal que pontua o filme com Charleton Heston de maneira primorosa, do começo ao fim. Lembro até hoje da primeira vez que vi o filme. 

Foi, obviamente, numa reprise em um cinema de Campinas (que nem existe mais). Eu devia ter uns 12 anos, mas lembro perfeitamente do impacto que "Ben Hur" me causou. Simplesmente não desgrudei os olhos da tela - e olha que estamos falando de um filme com quase quatro horas de duração! 

Anos depois consegui comprar a trilha, lançada pela Rhino Discs numa edição super especial com nada menos do que, pasmem, 88 faixas! No quesito épico, essa é mesmo insuperável...

23) FÚRIA DE TITÃS (Laurence Rosenthal) 

Laurence Rosenthal é outro excelente compositor que, a exemplo de John Scott, foi criminosamente subaproveitado pelo cinema. 

Entre seus melhores trabalhos está, sem dúvida, a trilha que compôs para o último filme do lendário Ray Harryhausen, famoso inventor do sistema stop-motion que utilizava para dar vida a monstros e criaturas delirantes. 

Eu assisti a "Fúria de Titãs" no cinema e fiquei noites sem dormir por causa da Medusa! A música de Rosenthal também me marcou muito, principalmente o majestoso tema principal, utilizado em poderoso arranjo, de excelente orquestração, para a cena que Perseus doma o cavalo alado Pegasus. 

O filme é uma verdadeira salada de mitos gregos e traz o consagrado Laurence Olivier brincando de Zeus, mas o compositor não dá bola e trata tudo com a maior seriedade. Felizmente, a trilha existe em CD e foi lançanda ainda numa edição espandida, com três faixas a mais do que as 14 originais.

O selo Intrada lançou há alguns ano a versão completa da trilha, em um álbum duplo maravilho.

24) CAÇADOR DO ESPAÇO - AVENTURAS NA ZONA PROIBIDA (Elmer Bernstein) 

Elmer Bernstein é um monstro sagrado na arte de compor trilhas para o cinema. 

São deles obras inesquecíveis como "Os 10 Mandamentos" e "Sete Homens e Um Destino". Mas minha trilha favorita composta por ele, acredite se quiser, é para um filme quase trash, chamado "Caçador do Espaço - Aventuras na Zona Proibida" que só eu devo lembrar que existe... Coisas de nerd!

Pior é que fiquei anos procurando pela trilha sonora, que só foi lançada recentemente pela Varese Sarabande. Antes ela só podia ser curtida junto com o filme ou num CD pirata de péssima qualidade. 

Gosto muito do tema principal, que é uma marcha bem aventuresca, e do tema associado à personagem Niki, que conta com solos de Ondes Martenot, instrumento favorito do compositor, que é uma variante do bizarro Teremin, e que está presente em muitas de suas trilhas.

25) POLTERGEIST (Jerry Goldsmith) 

Entre minhas trilhas sonoras favoritas não poderia deixar de citar "Poltergeist". Embora seja música composta para um filme de terror, aqui o mestre Goldsmith vai numa direção contrária à da trilha de "Alien".

Enquanto a segunda era basicamente atonal e repleta de sons sinistros e alienígenas, em "Poltergeist" a partitura baseia-se em primeiro lugar no tema da menina Carol Anne, que pode ser ouvido nos créditos finais com um coral infantil, e que representa a inocência em face do medo. 

Goldsmith explora o terror que vem dos espíritos malignos que infestam a casa da família Freeling contrastando suas aparições com o tema da criança. Existem algumas faixas que são de gelar o sangue, como "Twisted Abduction", que pontua a sequência em que Carol Anne é sugada pela porta do armário de seu quarto, ou "Night of the Beast", que é música de terror em estado bruto. 

Já outras são mais etéreas e remetem ao sentimento de estupefação e maravilhamento que acontece no primeiro momento do contato com os fantasmas ("The Light"). 

Mas o melhor da trilha acontece quando Goldsmith une essas duas aproximações com efeitos arrepiantes em "Rebirth", música que pontua a cena do resgate de Carol Anne, repleta de coral de vozes e efeitos orquestrais de grande complexidade. 

Nem preciso dizer que quando vi esse filme fiquei também várias noites sem dormir, em grande parte por causa da música espetacular do grande Jerry Goldsmith!

26) CAMPO DOS SONHOS (James Horner) 

Gosto de várias trilhas do James Horner, mesmo aquelas que ele copia algum outro compositor ou a ele mesmo, porém entre as melhores coloque a que criou para o filme "Campo dos Sonhos". 

Li em entrevistas com Horner que essa trilha foi sendo composta meio no improviso, junto com as imagens do filme e com os solistas que dela participam - tanto é que na hora de prepará-la para o lançamento em disco, gerou problema o fato de não existir uma partitura escrita para ela! 

Essa é uma das trilhas mais inspiradas do compositor, repleta de momentos delicados e reflexivos e temas bonitos que acompanham o filme surpreendente estrelado por Kevin Costner. 

Os destaques ficam para a faixa "The Cornfield", que pontua a primeira vez que o protagonista escuta a voz do além afirmando que "se você construir, ele virá", e "The Place Where Dream Come True", que marca o tocante encontro final entre o personagem e o convidado misterioso que aparece em seu campo dos sonhos. 

De fazer chorar mesmo o mais barbudo dos marmanjos...

27) QUANDO EXPLODE A VINGANÇA (Ennio Morricone) 

Só recentemente eu descobri o genial diretor Sergio Leone em toda sua plenitude. Até então, havia assistido apenas a "Era Uma Vez na América" e alguns pedaços de "Três Homens em Conflito" na TV. 

Depois de ver (quase) todos os seus filmes em DVD, cheguei à conclusão que se tratava de um cineasta completo, capaz de extrair o máximo de impacto de cada sequência que filmava, tanto em termos de técnica, quando de atuação. E a música do mestre Ennio Morricone tem papel importantíssimo em seus filmes. 

De seus faroestes, a que mais me tocou foi a trilha de "Quando Explode a Vingança", que´é o filme mais político de Leone, mostrando a revolução popular mexicana pelo ponto de vista de um andarilho safado que se une a um membro do IRA, especialista em explodir coisas. 

Morricone compôs um tema principal parecido com o de "Era Uma Vez no Oeste", também de Leone, e incorporou nele um solo vocal que canta literalmente "Sean-Sean", que é o nome do personagem irlandês de James Coburn! 

Em outra faixa, "A Marcha dos Mendigos", o compositor chega a incorporar um vocal que imita o coachar de um sapo, unido por um solo de bandolim que toca pequeno trecho de Mozart, com resultado altamente cômico! 

Para minha sorte, um selo europeu havia acabado de lançar um album duplo com a trilha completa, logo depois de eu ter visto o filme pela primeira vez. Nem preciso dizer que tenho, preciso?

28) IMENSIDÃO AZUL (Eric Serra) 

Adoro o mar e, obviamente, filmes sobre ele. Por isso, "Imensidão Azul" está entre meus filmes favoritos. 

Claro que a versão do diretor e não a picotada e reduzida que foi exibida na época. E como não poderia deixar de ser, adoro a musica composta por Eric Serra. 

Diferente do que estou acostumado a gostar, que é música orquestral, a trilha desse filme é toda tocada em instrumentos pop e sintetizadores, mas nem por isso deixa de ser tocante. 

É o tipo de música que agrada a todos - especialmente as mulheres - e que dá uma sensação de alegria imediata. Serra inclui sons que imitam o canto dos golfinhos e solos de saxofone lindíssimos em algumas faixas e encerra a trilha cantando em "My Lady Blue". 

Existem dois lançamentos diferentes da trilha de "The Big Blue": uma é um CD simples com 19 faixas e a outra é um CD duplo, com 33. 

Absurdamente, nos Estados Unidos a trilha de Eric Serra foi substituída por outra composta por Bill Conti, que nada mais era do que uma cópia mal feita da trilha original! Eta maniazinha ridícula que esses caras tem de mexer naquilo que já estava bom. Depois não entendem porque os filmes fracassam...

29) O SEGREDO DO ABISMO (Alan Silvestri) 

Alan Silvestri é um compositor muito irregular. Do tipo que alterna trilhas interessantes como "Predador" e "Contato" com outras abaixo do medíocre. 

Estranhamente, é o compositor favorito do diretor Robert Zemeckis, desde que trabalharam juntos em "Tudo Por Uma Esmeralda" e "De Volta Para o Futuro". 

Uma de suas trilhas mais eficazes é justamente a que compôs para o ótimo "The Abyss", filme aquático dirigido por James Cameron antes de "Titanic", que me marcou muito na época, principalmente por causa da cena em que o protagonista chega à cidade dos aliens submarinos, a qual me deixou arrepiado da cabeça aos pés. 

E grande parte do sucesso dessa obra se deve à trilha de Alan Silvestri, que intercala música orquestral pesada com solos de sintetizador, amarrando tudo no final apoteótico com a presença de coral de vozes. Nem preciso dizer que minha faixa preferida do CD é "Bud on the Ledge", justamente a música que acompanha a chegada do personagem de Ed Harris à majestosa cidade submersa. 

O filme foi lançado anos depois numa versão do diretor, que incluia um final bem diferente do original, que contava inclusive com a famosa cena da "onda gigante" criada pelos ETs para obrigar os humanos a acabarem com as hostilidades que estavam para culminar em guerra. Em 2014 a Varese Sarabande lançou a trilha completa do filme. Imperdível.

30) ET: O EXTRA-TERRESTRE (John Williams)

Não teria como ficar de fora essa maravilhosa trilha composta por John Williams para o que muitos consideram a obra-prima do diretor Spielberg. 

Uma verdadeira aula de composição para o cinema, a partitura de Williams começa discreta, destacando o clima de suspense do início do filme, e vai crescendo à medida que a amizade entre Elliot e E.T. desabrocha, até chegar ao final apoteótico na faixa "Escape/Chase/Saying Goodbye", capaz de arrancar lágrimas de qualquer um que tenha um coração batendo no peito.

Outros destaques ficam por conta das faixas "Far From Home/E.T. Alone", que descreve o começo do filme e corta para a perseguição que acaba deixando o alienígena sozinho na Terra, e "The Magic of Halloween", durante a qual Williams se dá ao luxo de citar o tema do Yoda quando as crianças cruzam com uma pessoa usando a fantasia do mestre Jedi de "Star Wars".

Existem várias versões da trilha, sendo a mais famosa a lançada na época que o filme chegou aos cinemas, mas que continha versões diferentes e versões para concerto da música que acompanha o filme (como tipicamente faz Williams com os álbuns de suas trilhas) e outras que disponibilizaram pela primeira vez a partitura completa tal qual ouvimos junto às imagens.