CASO OU COMPRO UMA BICICLETA - O FILME
Se conseguir sobreviver a duas horas de tortura, terá nas mãos um excelente compêndio dos dilemas que afligem a classe média
- por André Lux, crítico-spam
Olha, não vou dizer que esse "Comer Rezar Amar" é o filme mais ridículo que eu já vi porque seria uma injustiça com tantos outros ridículos que existem aos montes por aí. Mas chega perto.
E não posso nem reclamar de não ter sido avisado, afinal o livro que deu origem ao filme recebeu, de tão pertinente, as capas das famigeradas revistas Veja e Época!
O interessante de tudo, no final das contas, é que se você conseguir sobreviver às duas horas de tortura que é ver este filme, terá nas mãos um excelente compêndio de todos os dilemas e males que afligem a classe média, essa que, na luta de classes estudada por Marx, é a que mais sofre com questões fundamentais e profundas como "não sei se caso ou compro uma bicicleta".
Talvez seja porque o capitalismo permita que a classe média tenha, de vez em quando, acesso a tudo que só os ricos e famosos tem - como por exemplo, passar uma semana num hotel cinco estrelas e depois pagar as prestações da viagem o ano inteiro. Estudantes de sociologia, fiquem atentos!
O fato é que o personagem principal de "Comer Rezar Amar", interpretado pela ridícula Julia Roberts, é uma dessas representantes típicas da classe média: vazia, perdida, alienada, infeliz e angustiada que, no caso, não sabe se pede o divórcio ou compra uma bicicleta. O marido dela, por sinal, é apresentado com um verdadeiro chato porque se propôs, vejam vocês que absurdo, a conversar com ela sobre a falência do sistema de ensino público estadunidense!
Depois de muito pensar (cerca de cinco minutos na cama), ela decide que a parada é mesmo comprar uma bicicleta e sair pelo mundo em busca de "deus" (eufemismo para "um guru que me guie pela vida e me dê respostas fáceis para perguntas difíceis") depois de mais um fracassado romance com um atorzinho bobo.
Ela, coitadinha, passa então 4 meses em Roma, onde conhece um monte de italianos caricatos, depois muda-se para a Índia, onde medita num templo e conhece um monte de indianos caricatos.
Por fim vai para Bali, que é o local onde, além de um monte de balineses caricatos, encontra-se o seu guru espiritual, uma espécie de mestre Yoda dos pobres que toma decisões por ela com frases feitas do tipo: "Enxergue com o coração, não com a cabeça" (e eu aqui achando que a gente tinha que enxergar com os olhos!) ou "Para manter o equilíbrio é preciso se desequilibrar por amor".
Graças a essas frases de efeito profundas como uma poça de água ela resolve então se entregar ao novo amor de sua vida (eufemismo para "paixão de adolescente"), um galante brasileiro e dublê de príncipe encantado interpretado pelo espanhol Javier Barden (o que garante ao menos várias canções de bossa nova na trilha e algumas frases em português carregado de castelhano).
O mais impressionante de tudo é que o filme é sério pra caramba, não pense que toda essa baboseira digna dos piores livros de auto ajuda é tratada com leveza ou ironia. Nada disso, o lance é denso mesmo, pra, tipo, fazer você pensar, sabe? Uma verdadeira lição de vida, sacou?
Tudo digno mesmo de merecer a capa da revista Veja! É ou não é?
Cotação
Como filme: Zero
Como material de pesquisa sociológico: * * * * *
Só a premissa desse filme já me dá arrepios. Mas sua crítica é tão engraçada que a gente fica curioso!
ResponderExcluira unica forma de desintoxicão para tal veneno seria ver Sin Nombre(Sem Identidade, no Brasil) do estreante Cary Fukunaga... O ambiente social, criminal e a dinamica da imigração na America Central, em um retrato hiperrealista que pode ensinar muito até a quem acha que ja sabe das coisas.
ResponderExcluirO que é mais triste no filme é que ele busca uma identificação com o sonho e com as angústias de toda mulher. Mas que mulher é essa que viaja o muito inteiro durante um ano sem trabalhar, comendo nos melhores restaurantes e se hospedando em hotéis 5 estrelas.É um delírio mesmo, se eu tivesse essa grana toda e um pretendente como o Barden, eu até aceitava as frases clichê dos meus amigos. O filme não é pouco ridículo não, quanto aos esteriótipos italianos e indianos eu nem vou comentar, mas a Julia Roberts adora pagar um mico né....
ResponderExcluirCara! esse é o comentário mais engraçado sobre um filme que eu já li! Mas o que vc esperava de um filme baseado em um livro best-seller de livraria sebenta?! Nem perdi meu tempo! Mas agradeço a diversão!
ResponderExcluirEu assisti... mas fui acelerando pq o filme é bem cansativo... e os conflitos dela são bem esses mesmos... putz... Renato.
ResponderExcluirNão canso de ler essa resenha, é hilária! Humor no melhor estilo do blog "Classe Média Way of Life".
ResponderExcluirNão consegui terminar o livro, e isto é coisa que raríssimas vezes me acontece... daí fica fácil imaginar o nível de chatice que o filme deve ser.
ResponderExcluirLais/ São Paulo
Com as devidas desculpas pelo termo chulo - e num trocadilho a lá Revista Mad - o nome desse filme deveria ser "Comer Cagar Limpar - Mas Esse Último a Gente Deixa pra empregada"
ResponderExcluireu achei puro delirio do autor desse filme!!!
ResponderExcluirA versão feita pelo South Park é muito melhor. :-)
ResponderExcluir"Enxergue com o coração, não com a cabeça" (e eu aqui achando que a gente tinha que enxergar com os olhos!)"
ResponderExcluirBom, biologicamente o órgão responsável pela visão é o cérebro (mais precisamente o lobo occipital). Então, de certa forma, a gente enxerga sim com a cabeça.
Fora esse detalhe biológico, tenho de concordar com o anônimo acima. A versão do South Park (Comer, Rezar, Peidar) é infinitamente melhor.